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Desemprego bate no trabalho qualificado

140926-mercado-trabalho-desemprego (1)LUIZ GUILHERME GERBELLI, RENÉE PEREIRA – O ESTADO DE S.PAULO

22 Fevereiro 2016 | 05h 00 – Atualizado: 21 Fevereiro 2016 | 21h 52

No ano passado, segundo dados do Caged, foram fechadas 115 mil vagas para profissionais com Ensino Superior completo ou incompleto

A rápida deterioração do mercado de trabalho já começou a atingir os trabalhadores mais qualificados. Pelos dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho e Emprego, no ano passado, foram fechados 115 mil postos de trabalho com carteira assinada para os brasileiros com Ensino Superior incompleto ou concluído – um sinal preocupante da piora acelerada da atividade econômica em 2015 e que deve continuar neste ano.

A retração no saldo marca uma importante virada. No período entre 2004 e 2014, o País sempre criou empregos para os mais escolarizados. No auge, em 2010, quando o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro cresceu 7,6%, houve abertura de 306 mil empregos com carteira assinada para os trabalhadores com Ensino Superior completo ou incompleto. A demanda das empresas foi tão grande que tivemos um apagão de mão de obra qualificada no País, situação que se prolongou até o início de 2014.

O cenário começou a mudar com o desencadeamento da Operação Lava Jato e com os sinais de que a crise econômica veio mais forte do que se esperava. Tanto para 2015 como para 2016, os economistas estimam que a atividade deve recuar 4,0%. Se os números se confirmarem, será o pior desempenho econômico desde 1901.

Na esteira da retração do PIB, o mercado de trabalho passou por uma intensa piora num curto espaço de tempo, diz o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), João Saboia. “Normalmente, os empregados com mais qualificação são os últimos a perder o emprego porque as empresas seguram ao máximo esses profissionais, temendo dificuldade para recontratá-los no futuro.”

Perda gradativa. O saldo de emprego para os mais escolarizados vinha caindo gradativamente nos últimos anos, embora ainda permanecesse positivo. Para os trabalhadores com Ensino Médio completo, por exemplo, houve abertura de mais de 1 milhão de postos em 2010 e 2011. Nos dois anos seguintes, o saldo caiu para 700 mil, depois para 400 mil em 2014 até chegar ao fechamento de 490 mil vagas no ano passado.

“Em termos de emprego formal, no ano passado, o País perdeu o equivalente ao que ganhou em 2013 e 2014. Neste ano, podemos perder mais dois anos em termos de criação de emprego”, diz Saboia. Ele afirma que historicamente o mercado de trabalho é o último a reagir numa retomada da economia.

“Como no Brasil é muito difícil ajustar o trabalho tanto para cima como para baixo, as empresas optam por cortar outros custos. Nos últimos anos, foi possível perceber esse comportamento: o PIB vinha desacelerando, mas o emprego se mantinha”, diz Eduardo Zylberstajn, pesquisador da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe). “Agora, dado o tamanho da nossa crise, será preciso melhorar muito o ambiente e a confiança para as empresas voltarem a contratar”, afirma.

O “atraso” do mercado de trabalho para responder ao avanço da economia fica evidente na projeção dos analistas. Embora haja a expectativa de que a economia possa parar de piorar no segundo semestre deste ano, as projeções para o desemprego são de forte alta e por um período mais prolongado.

Deve piorar. No cenário da economista Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria Integrada, a situação do mercado de trabalho está longe de melhorar. As projeções apontam para um índice de desemprego de dois dígitos ao final deste ano. Pela Pesquisa Mensal de Emprego (PME), que inclui as regiões metropolitanas de Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre, o índice fecha 2016 acima de 10%, diz ela. Já na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad), que abrange todo o País, a taxa ficará próxima de 13%. Até o ano passado, os dois índices estavam em 6,9% e 9,0%, respectivamente. “Acredito que vai piorar bem o mercado de trabalho este ano.”

Alessandra destaca que, apesar dos setores de indústria e construção civil já estarem numa crise intensa e demitindo há 21 meses seguidos, a área de serviços estava mais resistente e só começou a demitir há oito meses. “Esse é um setor que contrata muito, pois inclui comércio e instituições financeiras que empregam muitos trabalhadores qualificados.”

Na opinião de Saboia, uma recuperação do mercado de trabalho só começará a dar sinais em 2018. Até lá, alguns milhares de trabalhadores vão engrossar a fila dos desempregados, que até novembro do ano passado somava 9,1 milhões de pessoas. “Prevejo muita piora até meados deste ano. No segundo semestre, pode haver uma ligeira melhora por causa da sazonalidade da economia.”