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Reforma Eleitoral: entre pontos polêmicos, Câmara debate sub-representação feminina na política

A pouco mais de um ano para o pleito de 2022, a Câmara dos Deputados retoma o debate acerca da Reforma Eleitoral. Nesta terça-feira (04/5) será instalada uma comissão especial para discutir o tema, e em paralelo atua o grupo de trabalho destinado a elaborar estudos para a reforma da legislação.

Os pontos discutidos são polêmicos. Vão desde a adoção do chamado “distritão” ao possível fim da cláusula de barreira, passando pela sub-representação feminina na política. Mas existe um consenso: a necessidade de atualizar um sistema que está defasado.

“Hoje temos uma balbúrdia legislativa. O que está sistematizado, o Código Eleitoral de 1965, está muito defasado. E o que tem de mais novo, toda legislação pós-Constituição de 1988, está distribuído em previsões legais assistemáticas”, afirmou o advogado Luiz Fernando Casagrande Pereira, coordenador-geral da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (ABRADEP).

A ideia é separar o que há de melhor, descartar o que não serve e criar regras novas, reunindo tudo em um novo Código Eleitoral. É uma chance de ouro para darmos um enorme salto de qualidade na segurança jurídica das regras eleitorais brasileiras”, disse.

Integrante do grupo de trabalho da Câmara, ele destacou que a reforma também pode trazer avanços para a representatividade feminina na política, tanto no quesito distribuição do Fundo Partidário quanto no número de mulheres que ocupam os espaços de poder.

“A reforma deve consolidar, calibrando a distribuição dos 5% do Fundo Partidário e do financiamento de campanha para incrementar a representatividade por gênero e raça. E inclusive das pessoas com deficiência”, pontuou.

A advogada Luciana Loureiro, membro fundadora da ABRADEP, assessora jurídica do Secretariado Nacional da Mulher/PSDB e vice-presidente do PSDB-Mulher do Distrito Federal, lembrou que a legislação é bem clara nesse sentido: os 5% do Fundo Partidário devem ser reservados para a criação e promoção de programas de participação da mulher na política. O que precisa ser feito é uma conscientização nos diretórios estaduais e municipais acerca do uso dos recursos exclusivamente para este fim.

Ela defendeu ainda que os Secretariados femininos tenham autonomia para gerir o repasse dos recursos, com uma prestação de contas assinada em conjunto pela presidente do Secretariado, o presidente e o tesoureiro do partido.

“Esse seria o melhor dos mundos para as mulheres. Elas teriam autonomia. Lembrando que, na estrutura do PSDB, todas as mulheres do Secretariado são eleitas nos três níveis de hierarquia partidária – nacional, estadual e municipal – e as decisões são tomadas de forma colegiada. Nunca é uma decisão individual”, assinalou.

COTAS PARA AS MULHERES

A sub-representação de mulheres na política brasileira também é um ponto que tem sido debatido pelo grupo de trabalho da Reforma Eleitoral.

Primeiro, há um diagnóstico: a situação do Brasil é um desastre. A sub-representação feminina é um escândalo”, declarou Casagrande Pereira. “Depois, é preciso reconhecer que a cota de 30% tem se mostrado insuficiente para assegurar às mulheres uma maior representatividade. Avançamos muito pouco. É necessário dar mais um passo, criando reserva de vagas”, opinou.

O que se discute é que, além de se manter a cota de 30% para candidaturas de mulheres nos partidos políticos, também haja um percentual de vagas reservado para elas no Legislativo, algo em torno de 15% a 20%.

Mas, para Luciana Loureiro, o grande problema é que mesmo a cota de 30% de candidaturas femininas na legislação vigente não reflete o número de mulheres que são efetivamente eleitas. Na Câmara Federal, por exemplo, as deputadas correspondem a apenas 15% do total de parlamentares. Na avaliação da tucana, o ideal, a princípio, seria uma reserva de vagas proporcional à cota de candidaturas femininas, que fosse progredindo gradualmente até a tão sonhada paridade de gênero na política.

Falar em 15% agora é nada, porque 15% nós já temos. Precisamos de mais. Por que não falar em 30%, ou 50% das cadeiras? De paridade verdadeira?”, questionou.

“DISTRITÃO” E CLÁUSULA DE BARREIRA

Outro ponto polêmico da Reforma Eleitoral é que alguns parlamentares defendem incluir na proposta de emenda à Constituição (PEC) a ser discutida, a adoção do chamado “distritão”.

Atualmente, o sistema é proporcional com lista aberta. Ou seja, o eleitor vota nos candidatos ou nos partidos, que podem se juntar em coligações. O quociente eleitoral, então, leva em conta os votos válidos e define o número de vagas que cada coligação ou partido terá, elegendo os mais votados. Nesse tipo de votação, existem os chamados “puxadores de votos”, candidatos com votação expressiva que garantem vagas para outros integrantes de suas coligações. Por conta disso, a renovação do Legislativo tende a ser maior, já que nomes menos conhecidos podem ser eleitos.

No chamado “distritão”, cada estado ou município se transforma em um distrito eleitoral. Dessa forma, são eleitos os candidatos mais votados, sem levar em consideração os votos para o partido ou coligação. O modelo acaba com os puxadores de voto, mas pode fazer com que as propostas dos partidos percam espaço, com eleições focadas em campanhas individuais, de nomes mais conhecidos e com mais recursos, o que dificultaria a renovação do Legislativo.

Nesse caso, o presidente da ABRADEP classificou a manutenção do atual sistema proporcional, com o fim das coligações, como a melhor opção.

“O distritão é o pior modelo possível, demolindo a figura dos partidos, fortalecendo, em paralelo, o messianismo, a figura do ‘salvador da pátria’. Joga-se por terra, assim, a coerência ideológica dos partidos, o campo das ideias. Com a representatividade diluída, também fica mais difícil a eleição de representantes de minorias”, considerou.

Casagrande Pereira também vê o possível fim da cláusula de barreira como um retrocesso. Para o advogado, a legislação deve ser mantida como está.

Atualmente, a lei restringe a atuação e o funcionamento de partidos políticos que não obtenham pelo menos 1,5% dos votos válidos para deputado federal em pelo menos um terço das unidades da Federação, com no mínimo 1% de votos em cada; ou que não consigam eleger ao menos nove deputados federais em, no mínimo, nove estados. Em 2022, essa barreira deve ser ampliada para 3% dos votos válidos para deputado federal, também em um terço das unidades federativas – ou 11 deputados distribuídos em nove estados.

Essas determinações limitam o funcionamento de partidos políticos “nanicos” dentro do Congresso Nacional, o que melhora a governabilidade. Os críticos à medida, no entanto, argumentam que a cláusula de barreira afeta a ampla liberdade e a diversidade ideológica dos partidos políticos, questionando a constitucionalidade da norma.