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“A quem interessa o aborto permitido”, por Mari Pessin

A temática acerca da legalização do aborto no Brasil encontra ressonância nos guetos capitalistas tipicamente masculinos, no período de industrialização da economia. O objetivo principal para defesa é o interesse politico, econômico, e de controle populacional.  Além do interesse em reduzir prejuízos e perdas nos postos de trabalho ocupados por mulheres, nas fábricas, tecelagens e indústrias. Suspeita-se que na época a prática do aborto era inclusive incentivada.

Neste contexto e diante do papel social ao qual a mulher estava submetida, foram solenemente ignoradas as graves consequências psicológicas, morais, sociais, e religiosas.

A presença da mulher no mercado de trabalho, a princípio foi concedida quase como um favor, devido à necessidade de aumentar a produção para atender a demanda de uma sociedade que crescia vertiginosamente em direção a novos padrões de consumo. Neste período a mulher tornou-se uma possibilidade de mão de obra barata.  Entretanto as ausências e atrasos, para menstruar, parir, maternar, amamentar e cuidar de filhos surgiam como desafios a serem superados a fim de aumentar os lucros. No discurso predominante, estas concessões acarretavam perdas e precisavam de uma solução. Pressionadas, muitas mulheres recorriam a ervas ou outros métodos para abortar, com medo de perder o emprego por conta de seus sintomas e de uma possível baixa no rendimento.

O excessivo número de horas trabalhadas e as condições a que eram expostas, também não favoreciam a manutenção de uma gravidez. Todos estes fatores somados contribuíam para disseminar o discurso do “direito a abortar”. Direito de quem?

O Movimento Feminista contribui de forma significativa e inegável para a conquista de direitos, entre eles, estudar, votar, frequentar uma faculdade e tantas outras mudanças fundamentais para o desenvolvimento da sociedade, como a conhecemos.

Porém, na análise da conjuntura atual de tantas e tão profundas transformações, observa-se a necessidade de atualização e aprofundamento do discurso feminista, a fim de orientar políticas de prevenção, proteção e segurança para mulheres.

A bandeira pela causa e defesa abortista utilizada de forma indiscriminada, acaba muitas vezes adquirindo contornos perigosos e criando tribos ideológicas distantes dos ideais de valorização e dignidade da pessoa humana, e neste caso a mulher e a nova vida que esta sendo gerada (sem entrar em detalhes ou desconsiderar aspectos científicos e ou jurídicos).

É claro que existem casos onde é indiscutível a necessidade de intervenção para proteger a mulher e a família de traumas maiores e irreversíveis. Entre estes casos, esta a anencefalia, uma especificidade do aborto, que faz parte das anomalias graves incompatíveis com a vida extra uterina.

Em Relatório divulgado pela ONU, em sua pagina ONU Brasil (2018), verifica-se que entre as causas mais frequentes para justificar o aborto estão: gravidez indesejada, comportamento inconsequente do casal, violência doméstica, falta de apoio do parceiro ou da família, uso errado de métodos contraceptivos, dificuldade de acesso a Rede Pública, gravidez precoce, estupro, risco de vida da mãe, impossibilidade de vida fora do ventre materno.

O mesmo Relatório da ONU BRASIL, afirma também que o abortamento é a 4ª causa de morte materna, sendo que parcela significativa ocorre devido ao abortamento provocado.

Todas as possíveis causas para abortar – aboriri “fazer perecer a vida” em tradução livre, justificam liberar, descriminalizar e tornar prática comum e usual, eliminar a vida humana no inicio de sua concepção?  Não da pra mensurar com exatidão as dificuldades pelas quais passa uma mulher que recorre ao aborto. Mas complexo também é afirmar que estamos cuidando desta mulher, por proporcionar a ela um aborto consentido por lei. Existe um grande vácuo entre o ato de cuidar e a letra fria da lei. Quem atuará neste vácuo?

O SUS – Sistema Único de Saúde encontra-se em situação precária, e não dá conta de atender ao contingente que demanda atenção todos os dias. Qual será o impacto social, humano, econômico e financeiro desta lei, se aprovada?

Será este um debate para ser defendido apenas por alguns segmentos, na grande maioria feminino? Na contramão do progresso e de melhores resultados, estamos em lados opostos falando do mesmo assunto, que na verdade é interesse de todos. Temática que permeia a vida de toda a sociedade e não se trata apenas de questão de gênero; é maior, bem maior que isso.  Queremos realmente decidir de forma unilateral pelo extermínio da vida que o homem ajudou a gerar. Definitivamente não se trata de questão de gênero.

Recentemente vimos publicada em jornais ao redor do mundo a morte de Norma McCorvey, conhecida como “Jane Roe” da histórica decisão do Supremo Tribunal dos EUA, que levou à legalização da interrupção voluntária da gravidez no país, morreu aos 69 anos, depois de uma parada cardíaca. Um detalhe muito importante e que chama a atenção conforme noticiais na mídia, é que Norma nunca chegou a abortar e tornou-se uma forte opositora do direito ao aborto que, anos antes, tinha ajudado a conquistar, afirmando publicamente que estava profundamente arrependida da posição que assumiu e do papel que desempenhou. Que se tivesse uma chance gostaria de voltar atrás e fazer diferente.

Neste cabo de guerra social e humana, não há vencedores.

Uma sociedade que se pretende igualitária, equânime e justa, não se constrói no discurso unilateral. Um olhar atencioso e demorado vai revelar que o momento evolutivo propõe a complementariedade entre homens e mulheres para avançar em conquistas e respeito mutuo.

A mulher é elemento essencial para a evolução da humanidade e sua atuação na economia, ciência, tecnologia, família, cultura e política, retratam sua importância e a excelência de sua cooperação em todas as áreas. A expertise, sensibilidade e intuição da qual é dotada, permite realizar coisas que somente ela poderia fazer. Possui condição única e inigualável, o PODER de gerar a vida.

O homem que tornamos monstro no debate de gênero, esta dentro de nossas casas, nossas vidas e nossos corações. Ele é o pai, o marido, o irmão, o filho, o amigo, o sobrinho, o neto. Ele é por consequência, o homem que nós educamos.

A criança a qual requeremos o direito de matar por meio do aborto legal descriminalizado é nossa filha, filho!

A mulher que luta por direitos, equidade, proteção, igualdade e respeito, sou eu, você e elas. Somos todas nós.

E momento de unificar nossa luta, apurar nosso olhar, nossa escuta e caminhar na direção da mudança. Estamos distraídos com detalhes, que foram propositalmente inseridos no contexto para dissipar nossos objetivos e confundir a direção.

Que espécie de SOCIEDADE queremos construir!

Neste sentido a prioridade é trabalhar a educação, prevenção, sensibilização e orientação, construir melhores políticas, no intuito de acolher e apoiar meninas, adolescente e mulheres, direcionar recursos e priorizar as questões de relevância entre elas; saúde sexual e reprodutiva na base. No entendimento de que prevenir é melhor que remediar conduzir não apenas as mulheres, mas toda a sociedade na direção da verdadeira igualdade de gênero a fim de reduzir e eliminar a discriminação, tanto a declarada quanto à velada que objetifica a mulher diminuindo seu papel – A objetificação, termo cunhando no início dos anos 70, e com grande predominância para os dias atuais, consiste em analisar um indivíduo em nível de objeto, sem considerar seu emocional ou psicológico.

Em resumo, para discutir a igualdade de direitos das mulheres, devemos ampliar o dialogo até alcançar a todos. Os meninos e homens precisam estar, na construção das temáticas que também os afetam diretamente, na mesa de debates, na plateia. É imprescindível o ENCONTRO para a convergência de ações complementares.

Caso contrário, o que estaremos ouvindo será apenas o eco de nossa própria voz.

*Mari Pessin é Mestre em Planejamento e Politicas Públicas e Coordenadora de Formação e Cidadania – PSDB Mulher do Paraná