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“Dez anos de luta”, por Solange Jurema

Foto: Tania Ribeiro
Foto: Tania Ribeiro

Foto: Tania Ribeiro

O Brasil comemora neste 7 de agosto os primeiros dez anos da Lei Maria da Penha com um misto de sentimentos contraditórios em relação a seus resultados concretos: de um lado as mulheres conquistaram um instrumento legal, de outro ainda se ressentem de uma efetiva aplicabilidade desta mesma lei.

Alguns avanços ocorreram, é inegável. A lei assegurou mais assistência social para as mulheres agredidas, preservou seus direitos patrimoniais.

O crime foi tipificado e a legislação aprimorada até chegar a caracterização de feminicídio e as penas condenatórias podem levar o agressor a trinta anos de cadeia. Porém, sua aplicabilidade ainda está muito distante do ideal ou mesmo do básico necessário.

A estrutura do aparato policial e de apoiamento jurídico, médico e assistencial à mulher agredida é reduzidíssimo e quase inexistente em algumas unidades da Federação.

As poucas delegacias especiais de atendimento a mulher ainda são carentes de pessoal qualificado e especializado para atender a mulher agredida, que ainda é submetida a diversos tipos de constrangimentos.

No âmbito do Judiciário ainda não existem varas específicas para tratar de feminicídios e a demora de julgamentos que caracteriza o sistema de justiça nacional parece ganhar maior lentidão quando os casos tratam de agressões a mulheres. Não há pressa, como se fosse natural e corriqueiro a violência contra a mulher.

Essa percepção se torna ainda mais cruel com a dura realidade dos números: a cada duas horas uma mulher é agredida no Brasil e sete são assassinadas por dia!

Números que envergonham.

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) fez um balanço no ano passado em que avaliou que os nove primeiros anos da Lei Maria da Penha mantiveram estável a taxa de homicídios contra as mulheres –5,43 óbitos para cada 100 mil mulheres – mas impediram que houvesse um crescimento da ordem de 10% ao ano, o que é um avanço a ser registrado.

Outra mudança positiva a ser registrada foi a agressão a mulher se tornar um “fato público” e não apenas do “âmbito privado”. Ou seja, mesmo que a mulher agredida recue da acusação ao companheiro ou ex-companheiro, o processo contra ele prosseguirá independentemente de sua vontade.

Mas ainda existem muitos problemas a serem superados. O pais ainda é carente de estatísticas confiáveis e que permitam a definição de políticas públicas precisas. Não há, por exemplo, número de condenações com base na Lei Maria da Penha.

Segundo o site G1, apenas 12 estados e o Distrito Federal tem dados compilados, mesmo assim incompletos no período de vigência da lei, de 2006 1 2016. Somente Sergipe têm registros anuais desde 2006.

Nos dez anos da Lei Maria da Penha, pela primeira vez o estado de São Paulo traçou o perfil da mulher que recorre à Justiça para registrar queixa: 59% delas são brancas (36% pardas e 5% negras) e 55% tem maior escolaridade.

Parece haver uma relação direta entre nível de escolaridade e de nível de informação, porque o acesso a queixas-crimes contra agressores não coincide com o perfil nacional das brasileiras agredidas.

Pela pesquisa do IPEA, a maior parte das brasileiras agredidas é negra, tem 20 e 39 anos e com baixa escolaridade.

Ou seja, ainda estamos distantes de comemorar plenamente a Lei Maria da Penha porque ainda não há um completo acesso às delegacias pelas mulheres que mais sofrem agressões. Por falta de informação ou ainda pelo medo que predomina entre as mulheres agredidas.

*Solange Jurema é presidente do Secretariado Nacional da Mulher/PSDB