Opinião

“Filhos do Zika: uma geração de doentes cresce no escuro”, por Céumar Turano

Céumar Turano_1Até 2014, a zika nem existia no Brasil e ninguém no mundo associava essa doença ao nascimento de crianças com terríveis deficiências cerebrais. Enquanto os epidemiologistas e virologistas tentam deter a epidemia antes que ela se espalhe ainda mais, os infectologistas e neurologistas se esforçam para compreender como o zika vírus afeta tão drasticamente a formação cerebral de bebês.

Até o dia 23 de abril, foram confirmados 1.198 casos de microcefalia e outras alterações do sistema nervoso, sugestivos de infecção congênita, em todo o país. Ao todo, foram notificados 7.228 casos suspeitos desde o início das investigações, em outubro de 2015, sendo que 2.320 foram descartados. Outros 3.710 estão em fase de investigação. As informações são do novo boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, divulgado no dia 26 de abril, que reúne as informações repassadas pelas secretarias estaduais de saúde.

Na busca por respostas precisas para explicar a relação entre zika e microcefalia, a mais aceita, até o momento, é a suposição de que, ao quebrar a barreira placentária, o vírus encontra um verdadeiro santuário no corpo do feto. A salvo das resistências imunológicas da mãe, eles podem agir agressivamente.

Enquanto os cientistas se descabelam para entender o que está acontecendo, uma geração de doentes cresce no escuro. Ao mesmo tempo em que procuramos respostas, precisamos lidar com os problemas. A doença é grave. Exames preliminares com os bebês microcéfalos apontam que o problema vai além da má formação craniana. O vírus ataca o cérebro o que pode indicar um grave comprometimento cognitivo e outros danos, como a epilepsia.

Segundo a neuropediatra Carla Gikovate, Mestre em Psicologia e Especialista em Educação Especial Inclusiva, “por se tratar de um vírus novo, ninguém sabe que tipo de comprometimento estas crianças terão no futuro. Só o tempo vai mostrar. Elas poderão ter desde crises convulsivas até dificuldade de aprendizagem”.

Como, então, enfrentar esta situação e, no futuro, assistir a estas crianças com microcefalia? Para Carla Gikovate, “é importante, neste momento, que haja uma estimulação precoce multidisciplinar, que inclui um trabalho de psicomotricidade e fonoaudiológico. Estes seriam os primeiros cuidados com estes bebês que estão nascendo. A partir daí, fazer um acompanhamento pra saber se estas crianças vão evoluir com um prejuízo cognitivo e intelectual importante”.

Diante desta situação, o Brasil está ainda completamente despreparado para as muitas vítimas que estão aparecendo. Há muito o que fazer. O país precisa adequar urgentemente sua rede de assistência. A nova geração de deficientes vai precisar de psicólogo, psicopedagogo e terapia ocupacional.

“É muito importante que haja uma integração maior entre o sistema de saúde e o sistema de educação. O ideal é que a escola regular, sob a supervisão da Secretaria de Educação Especial (Seesp), tenha uma estrutura com psicopedagogas e salas de recurso para receber estas crianças. Neste primeiro momento, devemos pensar em incluir esta estrutura na escola regular. É necessário já prever um programa de inclusão escolar diferenciado”, afirma Carla Gikovate.

Hoje, muitas famílias estão enfrentando vários dilemas e tendo que lidar com as consequências de um vírus que a comunidade científica praticamente desconhece. Estas famílias deram à luz os filhos de uma nova epidemia, num surto de saúde pública, mas lidam com eles, ali, sozinhas, na privacidade de suas casas.

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* Céumar Turano é jornalista, publicitária e radialista. Graduada “magna cum laude” em Jornalismo pela UFRJ. Tem MBA Executivo (COPPEAD), Mestrado em Psicologia Social e Doutorado em Comunicação e Cultura também pela UFRJ. Produtora Executiva de Conteúdo Web na Diretoria de Produção da TV Brasil. É filiada ao PSDB do RJ.