Opinião

“Rio espelha a tragédia brasileira”, por Terezinha Nunes

Foto: PSDB-PE

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Em visita a Nova Delhi , no segundo semestre de 2008, acompanhando missão empresarial à Índia, surpreendi-me com mais três amigas quando um motorista de táxi que só entendia sua própria língua – um dialeto – malvestido e com barba por fazer, pegou um atalho no caminho entre o hotel e o centro da cidade, percorrendo uma favela.

A companheira que ia na frente, com a certeza de que o motorista não entendia patavina do que falávamos – e era verdade – falou para as demais : “vamos nos preparar para o pior este homem está nos levando a algum lugar para nos atacar”.

O pânico durou eternos cinco minutos quando o motorista nos colocou finalmente em uma avenida e percebemos que ele nada mais fizera do que nos livrar de um engarrafamento infernal como os muitos em Delhi onde bicicletas, vacas, elefantes e automóveis dividem as ruas dando sempre a impressão de que vão colidir.

Fizemos vaquinha para dar uma boa gorjeta ao motorista que não deve ter entendido patavina. Entendíamos que havia nos salvo a vida.

A população da Índia, além de imensa, é tremendamente mais pobre do que a brasileira. Há muito mais favelas em Delhi do que nas capitais brasileiras, motoristas de taxi dormem no próprio carro porque não conseguem voltar para casa o mesmo acontecendo com centenas de pessoas que ocupam as calçadas do centro à noite, umas aos lados das outras. Não são moradores de rua. Simplesmente operários que durante o dia têm que trabalhar.

Recordei-me do episódio ao analisar o drama da empresária Regina Murmura, 70 anos, abatida este final de semana ao entrar por engano ao lado do marido na favela do Caramujo, no Rio, e ter seu veículo alvejado por vários tiros.

Estava a caminho de Niterói e o GPS acionado erradamente apontou como destino uma rua da favela. Mesmo drama vivido em agosto pela atriz Fabiana Karla, também na favela do Caramujo. Fabiana teve mais sorte, conseguiu sair a tempo quando seu carro estava sendo cercado por traficantes.

Ao contrário de Delhi, onde o índice de violência urbana é muito baixo para os graves problemas enfrentados pela população, e as muitas religiões conseguem, pelo que se presume, manter a paz social, o Rio de Janeiro traz o perigo a cada esquina nos locais onde favelas dominadas pelo tráfico chegam perto da beira-mar, onde vive a classe média e os mais ricos.

O pior é que as favelas cariocas, além de amedrontarem quem por elas trafega, há muito submetem seus moradores – sobretudo jovens – a trilhar um caminho sem volta.

E o final do mês de setembro foi profícuo de exemplos de arrepiar os cabelos como o do adolescente Eduardo Felipe Santos Victor, 17 anos, morto por policiais depois de ter abandonado a escola e a igreja – havia sido coroinha – para ganhar dinheiro com o tráfico, surpreendendo os vizinhos. “seria fácil recuperá-lo, tinha boa índole” afirmou um amigo.

O outro foi o caso do policial Caio César Ignácio Cardoso de Melo, 27 anos, que emprestava sua voz, nas horas vagas, à dublagem de personagens famosos da literatura infantil e juvenil como Harry Porter, e foi abatido durante uma das muitas blitz realizadas pela policia.

Não teve o direito de fazer o que mais desejava “defender seu povo” – como chegou a confessar a colegas que o conheciam na função de dublador.

É nessa terra conflagrada que o Rio ,uma das mais belas cidades do mundo, recebe as Olimpíadas em 2016. Barcelona se transformou urbanisticamente com uma Olimpíada. O Rio corre o risco de passar vergonha internacional. O Brasil idem mas se pergunta: o que foi feito nos últimos dez anos, pelo menos, para minorar a situação?

Quase nada. O quadro só faz se agravar e está menos vistoso porque a crise que o país atravessa não deixa margem para se pensar em mais nada que não seja a tragédia do dia seguinte.

* Terezinha Nunes é presidente do PSDB Mulher de Pernambuco