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“O sistema eleitoral precisa se aperfeiçoar para garantir um avanço das mulheres na vida política brasileira”

Foto: George Gianni/PSDB
Foto: George Gianni/PSDB

Foto: George Gianni/PSDB

Leia entrevista com Solange Jurema, presidente do Secretariado Nacional da Mulher/PSDB-Mulher

O universo feminino pautou a vida e a carreira da Alagoana, Solange Jurema, presidente nacional do PSDB Mulher, desde maio deste ano. Aos 65 anos, essa tucana, casada, mãe de três filhos e avó de sete netos, coleciona bandeiras e batalhas pelos direitos das mulheres. “Já tive muitas lutas consideradas utópicas. Um exemplo era a democracia no Brasil e hoje temos uma democracia plena. Sei que isso custou o sofrimento de muita gente, mas conseguimos”.

Formada em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, com especialização em Direito Constitucional e em Mediação e Arbitragem, cursou Gerência Social em Washington (Estados Unidos). Entre 1999 e 2002, esteve à frente do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher. Também foi presidente pró-tempore da Reunião Especializada da Mulher do Grupo Mercado Comum, Mercosul (REM).

Em 2002, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, Solange Jurema, assumiu a Secretaria de Estado dos Diretos da Mulher, atual Secretaria de Políticas Públicas para Mulheres. Da experiência de ter sido a primeira ministra da Mulher no Brasil, ela destaca: “Dessa maneira, foi possível aprofundar questões que não eram discutidas até então, dialogar melhor com os outros ministérios e órgãos políticos transversais do interesse das mulheres e implementar com mais competência políticas de gênero no Brasil.

As ações executadas por Solange Jurema, ultrapassam a questão de gênero.

Procuradora de Estado aposentada, com experiência em gestão pública e em políticas sociais de inclusão – teve participação no governo tucano de Teotônio Vilela Filho, entre 2007 e 2010, onde ocupou o cargo de secretária estadual de Assistência e Desenvolvimento Social – em janeiro deste ano, assumiu outro compromisso: A Secretaria Municipal do Trabalho, Economia Solidária e Abastecimento, da prefeitura de Maceió (AL), na gestão de Rui Palmeira (PSDB).

À frente do PSDB Mulher até 2015, Solange Jurema vem, desde setembro, se dedicando, junto com as integrantes da executiva nacional, a uma tarefa desafiadora: capacitar e estimular brasileiras de todas as regiões a entrar para a política. Um sonho que a presidente do segmento feminino do partido deseja ver materializado cada vez mais em prefeitas, governadoras, deputadas estaduais e federais, senadoras.

As mulheres já conquistaram o espaço que merecem na política?

Solange – Não. Uma pesquisa realizada, neste ano, pelo Instituto Patrícia Galvão apontou que 71% dos brasileiros consideram que a legislação eleitoral do país deve garantir metade de mulheres nas listas de candidaturas apresentadas pelos partidos.
O estudo indicou, também, que 78% da população defendem a obrigatoriedade de divisão meio a meio das listas partidárias e 73% aprovam punições às legendas que não apresentarem paridade entre os dois sexos nas suas candidaturas.
A legislação brasileira atual reserva apenas 30% das candidaturas e 10% do tempo de propaganda eleitoral para cotas de sexo. Os números deixam claro que o sistema atual prejudica particularmente as mulheres. Como elas não estão nas estruturas partidárias, elas não ocupam os principais cargos dos partidos, então também não têm acesso adequadamente ao tempo de televisão, aos recursos financeiros, à rede de capital político dos partidos. De um modo geral, o sistema eleitoral brasileiro precisa se aperfeiçoar para garantir um avanço das mulheres na vida política brasileira.

Essa tem sido uma Cruzada do PSDB Mulher. Em parceria com a Fundação Konrad Adenauer, temos promovido cursos de política para as mulheres, onde especialistas de diversas áreas passam informações, discutem os temas, esclarecem dúvidas.

Recentemente, na Bahia, foi perguntado às participantes do curso quem gostaria de entrar para a política. Ninguém levantou a mão. Diante da provocação das organizadoras, algumas se manifestaram na segunda “chamada”. Ao final, o número de candidatas a entrar para a política tinha aumentado substancialmente.

Na avaliação da senhora, os cargos no Legislativo deveriam ser divididos de forma igualitária entremulheres e homens?

Solange – Certamente e não sou a única a pensar dessa maneira. Recorro novamente à pesquisa do Instituto Patrícia Galvão. De acordo com o levantamento, 80% dos brasileiros consideram que deveria ser obrigatória a composição dos legislativos municipais, estaduais e nacional por metade de mulheres. Veja o caso do Senado Federal. Das 81 cadeiras, apenas oito são ocupadas por mulheres, e somente uma das 11 comissões permanentes da Casa é presidida por uma senadora. Na Câmara, somente 40 são mulheres entre os 513 parlamentares em cumprimento efetivo do mandato e também só uma das 21 comissões permanentes tem uma deputada no comando. Penso que o anseio da população por mais mulheres na política é reflexo do desejo da população por mudanças. A sociedade está cansada de ver sempre os mesmos parlamentares, os mesmos discursos. É nítida a demanda por novos quadros, independentemente de gênero, raça ou opção sexual. Como nós, mulheres, somos poucas na política, acabamos identificadas como um fator de renovação. E há ainda a percepção de que as mulheres são mais honestas do que os homens e, portanto, mais difíceis de serem corrompidas.

Por outro lado, o comando do país e da maior empresa, a Petrobras, está nas mãos de mulheres…

Solange – Sim, é verdade. E queremos ver essa oportunidade estendida a todas as mulheres. Em dois mil e dez, a disputa à presidência da república, no primeiro turno, ficou entre duas mulheres (Dilma Rousseff e Marina Silva) e um homem (José Serra). Para dois mil e catorze o quadro inicial apresenta o inverso: uma mulher e dois homens. O cenário demonstra que a alternância de gênero no poder é desejável e possível.

Voltando ao cerne da questão, ambas as presidentes não ganharam as posições “de bandeja” como se diz no popular. Cada uma chegou ao posto por caminhos diferentes, mas com históricos de esforço e superação. A presidente Dilma Rousseff enfrentou, como muitas brasileiras, a ditadura militar. Graça Foster entrou na Petrobras como estagiária de engenharia química e, neste ano, foi eleita a décima oitava mulher mais poderosa do mundo.

A nossa luta é para que histórias de mulheres que se destacaram na carreira deixem de ser uma surpresa e se tornem cotidianas. Que as oportunidades sejam para todas, de fato, e não apenas no discurso.

 

Em um país ainda culturalmente machista, como o Brasil, esse desejo não é uma utopia?

Solange – Não, é um direito legítimo. O artigo 5º da Constituição é claro: “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição”. Mas ao contrário do que prega a nossa Carta Maior, a discriminação, o preconceito e a violência ainda estão presentes na vida de milhares de brasileiras. E olhe que 40% da população feminina do país já são chefes de família, de acordo com o IBGE. Uma conquista? Não! Mais sacrifício. Apesar do aumento da participação feminina no mercado de trabalho, as diferenças econômicas pesam contra as mulheres. Salários mais baixos para a mesma função dos homens, tripla jornada e atendimento precário dos serviços públicos nas áreas sociais: educação, saúde, assistência social, habitação etc… Penalizam principalmente as mulheres.

E como garantir o cumprimento da lei? Com políticas de gênero. Os governantes devem estabelecer políticas de Estado, ou seja, que não mudem ao sabor do governo da hora. Creches, escolas públicas em tempo integral, postos de saúde de qualidade, próximos ao local de residência ou do serviço; programas de assistência à maternidade e à saúde da mulher; delegacias onde as mulheres se sintam acolhidas e não mais agredidas; centros de atendimento integral às mulheres vítimas de violência, transporte urbano com qualidade, política habitacional competente e abrangente e um política de atendimento e acolhimento aos idosos e deficientes são algumas das políticas reivindicadas pelas mulheres, que podem aliviar a carga pesada que hoje carregam substituindo o estado com trabalho na maioria das vezes voluntário de atendimento a população. Esse trabalho a mais, exercido pelas mulheres dificulta seu desenvolvimento profissional e as impedem, muitas vezes, de se dedicar a uma carreira política.

Uma forma de garantir a execução desses direitos é a atuação política. Para isso, as mulheres necessitam informação, conhecimento e organização.

* Publicado no site do Instituto Teotônio Vilela/ITV