Opinião

“Em 2022, mais mulheres pela democracia”, por Marina Zonis e Monica Rosenberg

Você já deve ter se deparado com a frase “o futuro é feminino” ao menos uma centena de vezes nos últimos anos. Mas já parou para pensar no que isso realmente significa? Faz algum tempo que pesquisadores estudam a relação entre democracia e direitos das mulheres.

Diversas instituições independentes já mencionam os direitos das mulheres como componente importante de uma sociedade livre. De acordo com a Freedom House, instituição internacional de defesa de direitos humanos, líderes autoritários têm oprimido mulheres, perseguindo instituições da sociedade civil que lutam por seus direitos e estimulando a violência física e verbal contra elas, como forma de demonstração de poder e força.

A professora Sonia Corrêa, pesquisadora da London School of Economics and Political Science (LSE), diz que onde a democracia se expande os direitos das mulheres se expandem junto; e o oposto também é verdade, quando a democracia é ameaçada, os direitos das mulheres também o são.

Sendo assim, a frase “o futuro é feminino” é mais literal do que se pensa: um futuro mais igualitário para homens e mulheres é essencial para uma democracia real. A questão é: como atingir esse futuro?

Com certeza, não é minimizando o problema e reduzindo investimentos em boas políticas públicas. Parece óbvio, mas não é. O exemplo está mais próximo de nós do que se pode imaginar. A Prefeitura de São Paulo acaba de reduzir em 37,5% os recursos para enfrentar a violência doméstica na cidade. Redução de impostos é um ponto positivo? Sim, quando a redução é em despesas acessórias, que inflam a máquina pública desnecessariamente. Com os números avassaladores de agressão e ameaça contra mulheres, ainda mais agravados durante a pandemia, obviamente esse corte não é justificável.

Para que o futuro seja feminino e justo para todas as pessoas, é necessário que algumas discussões parem de ser ignoradas: não dá mais para negar que meninas de baixa renda precisam de ajuda para enfrentar a pobreza menstrual, certo? Não dá mais para negar que precisamos de mais políticas públicas que combatam seriamente a violência doméstica. Muito menos dá para negar que precisamos de um setor privado mais consciente que combata desigualdades salariais baseadas em gênero.

Todos os pontos acima são responsáveis pela diminuição de dinheiro, de recursos. Ou seja, impactam no curto prazo o feminino, e todos os demais no longo prazo. Não precisa concordar conosco sobre justiça social. Só precisa concordar sobre economia. Ou negar os dados globais e nacionais elaborados no tema. É uma escolha.

A forma de mudar este cenário, de acabar com o negacionismo sobre direitos das mulheres, é nos dar a oportunidade de participar dos debates que versam sobre o ambiente público. Isso significa avançar em mais uma pauta, a mais delicada e mais atrasada de todas: a participação feminina na política.

Estudos mostram que, quanto maior a presença feminina nas instituições de um país, menores são as oportunidades de corrupção. Um estudo publicado no Journal of Economic Behavior & Organization, de Chandan Cuma Jha e Sudipta Sarangi, do Departamento de Economia da Universidade Virginia Tech, apontou que a corrupção é menor onde mulheres participam em maior número no governo. A análise foi feita em mais de 150 países, entre eles o Brasil.

Além disso, pesquisadores do Departamento de Economia da Williams College demonstraram (*), numa pesquisa em que foram analisados bancos de dados com informações sobre 43 países nas décadas de 1980 e 1990, que as mulheres estão menos envolvidas em casos de suborno e menos propensas a aceitar este comportamento. Assim como países que têm mais mulheres como membros do Legislativo e do Executivo também tiveram menor incidência no índice de corrupção. O estudo ainda menciona que, a partir da defesa de que com mais mulheres a corrupção seria reduzida, países como França, México e Peru tomaram medidas para aumentar a participação feminina em cargos políticos.

A quem interessam a diminuta participação feminina na política e a violência direcionada a elas? Ao status quo. Interessa àqueles deputados que você odeia, de quem você reclama todo fim de semana na mesa de bar. A melhor forma de manter a política como está é continuar não apoiando que pessoas diferentes ocupem os espaços de poder.

Informar-se e votar diferente é uma escolha. Em 2022, você vai só reclamar com os amigos na mesa do bar de novo? Ou entrar no nosso time?

(*) Questionamentos sobre a frase “alguém que aceita suborno no exercício de suas funções” tiveram como resultado 77,3% das mulheres classificando como comportamento que nunca se justifica, enquanto o resultado masculino foi de apenas 72%.

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*Marina Zonis e Monica Rosenberg são advogadas, respectivamente, coordenadora da setorial Mulheres do Movimento Livres e coordenadora estadual do Movimento Livres em São Paulo. Artigo publicado no Estadão.