Artigo da diretora-presidente da Sabesp, Dilma Pena, publicado na edição de quinta-feira (29) do jornal Folha de S. Paulo
Uma parceria só é justa e eficiente quando há equilíbrio na divisão de responsabilidades e benefícios.
O novo Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab) passa a impressão de que o governo federal ainda não assimilou essa lógica.
Apesar de contar com Estados, municípios e empresas privadas para investimento e execução de quase metade dos R$ 508 bilhões previstos para os próximos 30 anos, o governo federal tapou novamente os ouvidos para a mais importante reivindicação do setor: a redução da carga tributária imposta.
Em 2012, as empresas de saneamento depositaram cerca de R$ 2 bilhões nos cofres federais na forma de PIS/Pasep e Cofins. A Sabesp respondeu por cerca de um terço desse valor, com R$ 654 milhões. No total de tributos, a Sabesp repassou R$ 1,2 bilhão aos fiscos no ano passado.
Façamos juntos uma reflexão: por que smartphones, películas para cinema e até a subsidiária instalada no Brasil pela Fifa não pagam PIS/Pasep e Cofins e quem trata e fornece água para a população paga?
O grau de desenvolvimento de um país só é aferido de fato pela qualidade de vida da população. Água limpa e esgoto coletado e tratado são fundamentais. Nesse aspecto, o Brasil exibe níveis críticos de subdesenvolvimento. Isso explica o veto do governo federal à visita de uma comitiva da Organização das Nações Unidas que avaliaria a situação do acesso à água e saneamento no país, conforme denúncia publicada no site da entidade.
Em São Paulo, a Sabesp caminha para universalizar o atendimento no interior em 2014 e em todo o Estado até o fim da década. No Brasil, mais da metade da população ainda não é atendida por esgotamento sanitário, segundo dados de 2011 do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento. A estrutura disponível para tratamento de esgoto é ainda pior: alcança 37,5% do volume coletado. E, em pleno século 21, 18% dos brasileiros ainda não têm acesso a água tratada.
Na última disputa presidencial, tivemos a impressão de que o saneamento, finalmente, passaria a fazer parte das prioridades nacionais. Os principais candidatos, incluindo a hoje presidente Dilma Rousseff, comprometeram-se com a desoneração do setor. Nosso ânimo aumentou quando o Ministério das Cidades informou, no ano passado, que a esperada medida estava a caminho. Mas as expectativas se frustraram.
E o Plansab não é um alento. Embora tenha sido constituído, conforme anuncia o Ministério das Cidades, “a partir de ampla participação cidadã e de diferentes setores da sociedade”, o plano ignorou a proposição das empresas de saneamento, personagens-chave desse processo.
Temos uma proposta clara: reverter todo o valor da isenção do PIS/Pasep e Cofins em investimento direto em infraestrutura. Essa alternativa oferece de imediato ganho de tempo e eficiência em prol da universalização do saneamento no país, já que falamos de companhias com conhecimento técnico e projetos de expansão já estruturados, mas que necessitam de fôlego financeiro para colocá-los em prática.
A desoneração pode detonar um ciclo virtuoso no país. Em nada colide com a bem-vinda disposição do governo federal de investir anualmente de R$ 10 bilhões a R$ 12 bilhões em saneamento. Menos ainda impede a concessão de linhas de créditos a prefeituras e Estados.
É uma proposta que se soma às demais diretrizes do Plansab. Inclusive incentivaria a ampliação de parcerias entre empresas e municípios para a elaboração dos planos de saneamento requisitados para a transferência das verbas federais. Na atual situação, inúmeros municípios correm o risco de ficar sem o repasse pela falta de experiência na elaboração de planejamento.
Aprovado pelo conselho do Ministério das Cidades, o Plansab aguarda agora a apreciação da presidente Dilma. Esperamos que seja ouvida essa reivindicação. Afinal, o que está em discussão são serviços essenciais à vida e não meros bens supérfluos de consumo.