Em meu primeiro mandato como deputada Federal, passei a fazer parte de um grupo de trabalho cuja função era aprimorar o famigerado Estatuto da Pessoa com Deficiência. A ideia era adequar o texto do projeto para que ele entrasse em sintonia com a Convenção da ONU sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência.
Foi assim que a ideia de relatar o Estatuto surgiu como uma grande noção de responsabilidade e dever que eu não podia abrir mão de cumprir. Eu me sentia a mais preparada para aquela função, pois além do meu envolvimento direto com o tema, sabia que em nenhum momento deixaria de imprimir os anseios da sociedade. De ouvir as vozes que um dia também haviam sido minhas quando era uma militante da causa.
Hoje, após mais de 15 anos de tramitação, o Estatuto, totalmente reformulado e escrito por várias mãos, tornou-se a robusta Lei Brasileira de Inclusão (LBI). Depois de um árduo trabalho de consultas e audiências públicas, o projeto passou por uma negociação cuidadosa com o Governo até que fosse sancionado pela presidente.
Nada disso, no entanto, seria possível não fosse a participação da sociedade civil na construção do texto.
O texto da LBI aprovou mudanças importantes nas áreas de educação, trabalho, cultura, lazer, esporte, entre outras. E principalmente: ela pensa no protagonismo da pessoa com deficiência em todas as esferas.
Para garantir o direito de ir e vir, alteramos o Estatuto das Cidades, transferindo ao Poder Público a responsabilidade pela manutenção e reforma das calçadas de todo os municípios do País, garantindo um passeio uniforme e acessível a todos os brasileiros. O texto da LBI não só passou a responsabilidade da reforma de calçadas ao poder público, como criou instrumentos legais para o seu cumprimento, ampliando a ideia da Campanha Ministério Público de Contas pela Acessibilidade Total e passando aos Tribunais de Contas de todo o país a fiscalização das normas de acessibilidade em obras e também no passeio público. A medida obrigará o gestor a se comprometer com a acessibilidade e fazer uso responsável do orçamento da cidade.
Como sabemos, há décadas, a legislação brasileira de calçadas não funciona. Incumbir ao munícipe a reforma do passeio é somar ao contribuinte mais uma conta que é de dever do Estado. Finalmente, conseguimos aprovar uma lei cujo descumprimento resultará em punição ao gestor público.
Em São Paulo, por exemplo, essa realidade está ainda mais próxima com a aprovação do projeto de lei nº 79/13, de autoria do vereador Andrea Matarazzo, que transfere à prefeitura a responsabilidade pelas calçadas da cidade.
Ainda na LBI, fizemos questão de garantir informação adequada e acessível à pessoa com deficiência, a seus familiares e cuidadores sobre sua condição de saúde, autonomia e qualidade de vida. A Lei Brasileira de Inclusão exige que os espaços dos serviços de saúde, tanto públicos quanto privados, assegurarem acessibilidade física e de comunicação, atendendo às especificidades das pessoas com deficiência física, sensorial, intelectual e mental.
Com isso, as unidades básicas de saúde devem ter não só equipamentos acessíveis, como por exemplo, mamógrafos e macas para mulheres cadeirantes, mas também intérpretes de Libras para prestar atendimento ao público com deficiência auditiva.
Na educação, a Lei inclui a oferta de um auxiliar de vida escolar na educação básica. E as escolas que não aceitarem a matrícula de alunos com deficiência – ou cobrarem taxa extra desses alunos – já podem ser punidas. E as editoras de livros, no lançamento de suas obras, não poderão, em hipótese alguma, podem negar a oferta do livro acessível ao público com deficiência visual.
Ainda propomos programas no mercado de trabalho. Empresas que contratarem pessoas com deficiência para participarem de programas de capacitação terão também de empregá-las durante o mesmo período, garantindo não apenas a qualificação, mas um trabalho simultaneamente.
Pensando em direitos ainda mais distantes da população com deficiência, garantimos o poder de escolha desse público em espaços como cinemas, teatros e casas de espetáculos, que deverão oferecer locais acessíveis em todo o estabelecimento, não só em áreas segregadas.
Além disso, alteramos o Código de Trânsito, permitindo que as autoridades possam fiscalizar as edificações públicas ou privadas de uso coletivo, como shoppings, supermercados e hospitais, onde as vagas reservadas para idosos e pessoas com deficiência não forem respeitadas.
Neste 3 de dezembro, Dia Internacional da Pessoa com Deficiência, temos a missão de não só cobrar o cumprimento da LBI, como trabalhar para que a lei seja implementada da forma mais íntegra possível. O brasileiro com deficiência finalmente tem uma ferramenta para exigir seus direitos e ter uma vida.