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Mulheres fazem greve nacional no México para protestar contra alto índice de feminicídios

Na semana passada, o México testemunhou uma greve nacional em protesto aos casos de violência contra a mulher. Veracruz é o estado mexicano com mais feminicídios. De lá se propagou a convocação para a greve nacional que aconteceu em 9 de março. Foi o coletivo As Bruxas do Mar, nascido em setembro, que promoveu a ação nas redes sociais. Arussi Unda, uma de suas porta-vozes, concorda com Reyes quanto ao resultado da greve: “É apoiada mais nas empresas transnacionais do que nos negócios locais”. O mais relevante é a resposta das instituições. “O Instituto da Mulher nos chamou para organizar oficinas e também alguns prefeitos nos contataram para falar das petições que lhes entregamos”, acrescenta Unda.

Além de liderar em feminicídios, ultrapassando o Estado do México [um dos 31 estados do país, onde fica localizada a capital], apesar de ter metade de sua população, Veracruz também é um dos poucos estados que emitiram dois alertas de gênero, um mecanismo idealizado para propiciar políticas públicas de prevenção e acesso à Justiça. “No entanto, continuam nos matando. O protocolo não está servindo ou está sendo mal empregado”, diz Unda. As demandas do movimento feminista local incluem a criação de uma promotoria especializada em violência machista e desaparecimento forçado, serviços de saúde integrais e abrigos para mulheres vítimas de violência.

No estado mais letal para as mulheres não há sequer um abrigo. “Se elas não podem ser levadas para um espaço seguro, é impossível interromper o ciclo de violência”, explica Judith Muñoz, outra das Bruxas do Mar, afônica depois da manifestação de domingo, que elas descrevem como histórica. “Saíram às ruas mulheres de alta posição com outras de baixos recursos. É um marco. Aqui nos sentimos muito isoladas, não há com quem fazer uma frente unida.”

Durante quase 90 anos, Veracruz foi um castelo inexpugnável do Partido Revolucionário Institucional (PRI). O último governador do partido, Javier Duarte, simbolizou a decomposição final das instituições estatais. Preso desde 2017 e com várias causas em aberto pela chocante dilapidação dos cofres públicos e vínculos com o crime organizado, sua política de terra arrasada incluía licitações fraudulentas, empresas-fantasmas, desvio de recursos, recorde de jornalistas assassinados, mais fossas clandestinas do que municípios e grupos paramilitares incrustados na estrutura estadual para fazer desaparecerem sistematicamente supostos criminosos.

Varrido o PRI, nos últimos quatro anos houve tempo para que o Governo do estado fosse ocupado tanto pelo Partido da Ação Nacional (PAN), a direita mexicana, como pelo Movimento Regeneração Nacional (Morena), de esquerda. “Tanto faz quem estiver lá, as mulheres nunca foram uma prioridade na agenda dos partidos. O Morena se diz mais feminista e fez o maior corte nos programas contra o câncer de útero e de mama”, acrescenta Unda. A efervescência com a qual seu grupo subiu posições para ocupar o foco dos meios de comunicação nacionais durante o último mês também provocou controvérsias e discussões dentro do movimento feminista. “Por um lado, somos acusados ​​de ser panistas conservadoras e, de outro, somos feministas loucas e abortistas”, resume sua porta-voz.

“Não basta apenas parar um dia para consertar tudo o que está torto aqui”, argumenta Reyes, atrás de seu carrinho de sorvetes. “Todo mundo tem que trabalhar, a polícia, o Governo, os juízes, para nos proteger.” Apesar da força industrial do estado, abençoado com petróleo, gado e o comércio portuário, Veracruz também lidera as estatísticas ––junto com os estados pobres de Guerrero, Chiapas e Oaxaca–– de exclusão feminina: mais de 15% das mulheres nunca foram à escola nem trabalharam fora de casa. Um terço delas se casou ou começou a viver com o companheiro antes dos 18 anos.

As Bruxas do Mar continuam trabalhando para transformar a raiva em esperança: em apenas seis meses de atuação organizaram oficinas de autodefesa, mercados para apoiar artesãs e uma rede de acompanhamento virtual, replicada em várias entidades. Elas se organizam em grupos do WhatsApp e aproveitam a função do telefone que permite o rastreamento em tempo real. “Temos até mesmo mulheres de grupos pró-vida participando. E tudo bem, porque não é apenas para mulheres feministas, é para todas.”

*Com informações do jornal El País