Opinião

“Quando o micro é macro”, análise ITV

Carteira de Trabalho e Previdência Social. Foto: Marcos Santos/USP ImagensCom a economia brasileira nas cordas, o governo Michel Temer passou a alinhavar medidas que tenham chance de reativar os motores da atividade produtiva num espaço de tempo mais curto do que as reformas estruturais são capazes de conseguir. Há pequenas engrenagens que, se bem ajustadas, têm o condão de promover resultados consideráveis.

Espera-se para os próximos dias o anúncio de medidas chamadas de “microeconômicas”, ou seja, intervenções pontuais que poderiam ajudar a melhorar o ambiente de negócios no país, destravar investimentos e, desta forma, reavivar a geração de emprego e renda num país combalido por uma recessão de cerca de 9% em quase três anos.

No rol de iniciativas estariam, segundo as primeiras informações veiculadas pelos jornais, a desburocratização de negócios, a flexibilização de regras trabalhistas, a liberação de recursos do FGTS para quitação de dívidas, a renegociação de tributos em atraso e, como pano de fundo, uma redução mais volumosa da taxa básica de juros.

A agenda de reformas microeconômicas já foi tentada no país, e deu certo. No início do governo Lula, um grupo de economistas de inclinação liberal, e, sobretudo, realistas, juntou-se ao então ministro da Fazenda, Antonio Palocci, para implementar mudanças que impulsionassem a competitividade da economia brasileira.

Eram medidas de aumento da eficiência econômica, para elevar a produtividade dos fatores, da renda e da taxa de retorno dos investimentos, conforme foi sintetizado no documento “Reformas microeconômicas e crescimento de longo prazo”, publicado em dezembro de 2004 pelo Ministério da Fazenda, sob a coordenação do então secretário de Política Econômica, Marcos Lisboa.

As reformas microeconômicas do início do governo Lula se valeram, evidentemente, de um ambiente macroeconômico muito mais benigno do que a gestão Temer terá de encarar agora.

Naquela época, as contas públicas estavam em ordem e o tripé macroeconômico baseado em responsabilidade fiscal, metas de inflação e câmbio flutuante funcionava plenamente, permitindo que o país rumasse para um ciclo de crescimento sustentado – que, entretanto, durou bem pouco tempo.

Orientada pela importância do desenho institucional e legal tanto para o adequado funcionamento dos mercados quanto das políticas públicas, a agenda de reformas microeconômicas buscou promover a melhoria da qualidade tributária e do ambiente de negócios, o desenvolvimento do mercado de crédito, a redução do custo de resolução de conflitos e a promoção do comércio exterior. Produziu bons resultados.

O documento da Fazenda, por sua vez, dava sequência a discussões de um grupo suprapartidário de economistas que, nas eleições de 2002, levara a debate a chamada “Agenda Perdida”, também na linha de implementar ajustes microeconômicos capazes de reavivar os motores de crescimento da economia brasileira, com combate à desigualdade e promoção de justiça social.

Ambos os diagnósticos e as medidas coincidiam. Parte delas medidas foi levada adiante na gestão Palocci e parte não saiu do papel. Num segundo momento, a gestão da economia sob o PT enveredou pela antítese das reformas microeconômicas e se valeu do mais deslavado voluntarismo, inflando a concessão de subsídios, as desonerações fiscais, a redução dos juros na marra e catapultando a concessão irresponsável de crédito. Os resultados desta política intervencionista e desastrada estão à vista.

É salutar que a gestão Michel Temer busque agora encontrar saídas mais imediatas para a crise que aflige 200 milhões de brasileiros. As medidas microeconômicas devem correr em paralelo, ao mesmo tempo em que o governo dedica energia para aprovar no Congresso a PEC da responsabilidade, limitando os gastos públicos nos próximos anos, e a reforma da Previdência.

O que não se pode é voltar a admitir os remendos e os paliativos em que os governos do PT incorreram desde a crise econômica global dos anos 2008/2009. Foi a ressurreição de políticas comprovadamente fracassadas, que ampliaram a presença do Estado na economia e tornaram o ambiente de negócios muito mais complicado, que levou o país ao buraco de onde agora ele precisa ser retirado, ajustando-se um a um dos parafusos da engrenagem.