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“A reforma”, análise do ITV

economia-aposentadoria-foto-ebcA reforma da previdência começou, finalmente, a tramitar nesta semana no Congresso. O país está diante de questão crucial para seu futuro como nação, com vistas à garantia da solvência de seu sistema de aposentadorias e pensões e à preservação do modelo de bem-estar social que veio sendo construído desde a Constituição de 1988. Desta encruzilhada é que nascerá o Brasil que queremos ser.

O governo Michel Temer tem o mérito de enfrentar um problema que foi negligenciado pelos governos do PT ao longo dos últimos anos. De agenda necessária, a reforma da previdência foi transformada em tema proibido no Brasil e, pior ainda, em arma eleitoral abusada pelo marketing guerrilheiro petista. No mundo real, o país afundava.

Desde 2014, o desequilíbrio do regime geral de previdência brasileiro, o INSS, explodiu. O déficit saiu da casa de R$ 50 bilhões para perto dos R$ 150 bilhões estimados para este ano. No regime próprio dos servidores, o rombo neste ano deverá ser de R$ 35 bilhões e no dos militares, de R$ 32 bilhões. Não há como algo assim parar em pé.

A última tentativa robusta de reforma do sistema previdenciário ocorreu ainda no primeiro mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso. Já em 1998, ou seja, há quase 20 anos, tentou-se aprovar a idade mínima para concessão de aposentadorias e pensões. Com oposição do PT, a proposta não prosperou no Congresso.

Desta forma, o Brasil continuou sendo um dos 13 países do mundo que não exigem idade mínima para concessão de aposentadoria, de acordo com levantamento divulgado pela AISS (Associação Internacional de Seguridade Social). No grupo dos desajustados, estão nações como Nigéria, Argélia, Turquia e Egito. Não fosse a criação do fator previdenciário, o buraco no sistema brasileiro de previdência teria aumentado muito mais.

A proposta enviada nesta semana ao Congresso tem a virtude de aproximar o regime brasileiro de um modelo que seja minimamente sustentável. Tal como está hoje, não é, inclusive por questões demográficas insofismáveis. Em pouco tempo, a proporção de idosos na população nacional – hoje em torno de 12% – deverá quase triplicar, chegando a 33% até o meio do século. Tal como está hoje, o sistema é impagável com esta nova pirâmide etária.

Mesmo com todos estes méritos, caberá ao Congresso o papel de discutir e aperfeiçoar a proposta de emenda constitucional, cujo relator na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara já se manifestou favorável à admissibilidade do texto. Agora é a hora de começar o bom debate que uma matéria tão séria e importante para o país precisa.

Não será uma discussão fácil, seja pela natureza do tema, seja pela disposição política dos que mais querem atrapalhar do que ajudar o Brasil a sair da crise e melhorar as perspectivas para o futuro. O governo federal decidiu deixar de fora do texto os militares, que serão alvo de projeto de lei específico no futuro. Trata-se de um compromisso que não poderá ser esquecido de maneira alguma ? dada a gravidade do atual quadro do sistema previdenciário e os sacrifícios exigidos de toda a sociedade, ninguém pode deixar de contribuir com esse esforço pelo país. O mesmo vale para policiais militares e bombeiros, cujas aposentadorias e pensões são geridas pelos estados: que os governadores e as Assembleias Legislativas proponham suas respectivas adequações, sem medo de pressões corporativistas.

Outro aspecto que pode e será alvo de discussão no Congresso refere-se às regras de transição, defendidas pelo Instituto Teotônio Vilela em recente estudo com diagnósticos e propostas para garantir a sustentabilidade do sistema previdenciário. O texto original do governo não altera a situação de quem já atende aos critérios para se aposentar e prevê um período adicional de contribuição para homens com mais de 50 anos e mulheres acima dos 45 anos. É possível desenhar um modelo com mais escalonamentos por faixa etária para quem já faz parte do sistema, desde que o impacto dessa medida seja calculado com precisão e responsabilidade ? já nos basta a experiência populista do lulopetismo com as contas públicas e o preço que a economia do país tem pago desde então.

O governo parece ter optado pelo envio de uma proposta com o desenho mais austero possível, ciente de que a tramitação no Congresso será submetida a fortes pressões corporativistas. É da natureza do processo político ter alguma gordura para queimar, para poder preservar a essência de uma medida tão fundamental como essa. Da reforma da previdência depende o futuro não só dos 200 milhões de brasileiros, mas também dos nossos filhos e netos que ainda nem nasceram. Trata-se da própria defesa do estado brasileiro, de um estado que tenha um sistema previdenciário sustentável e que mantenha condições de investir nas demais políticas públicas tão necessárias ao país.

Quem tem responsabilidade com o futuro do país não pode poupar esforços para garantir a aprovação de uma reforma que chega com quase duas décadas de atraso e que já foi feita em praticamente todos os países que nos servem de exemplo de desenvolvimento, cidadania e bem-estar social. O Brasil não pode perder mais uma oportunidade como essa.