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“Sobre ser pró-vida”: Ana Sofia Monteiro

Arquivo pessoal de Ana Sofia Monteiro
Arquivo pessoal de Ana Sofia Monteiro

Arquivo pessoal de Ana Sofia Monteiro

Com o recente julgado do Supremo Tribunal Federal brasileiro que admitira, no caso concreto, o aborto com menos de 3 meses de gestação, a discussão sobre a legalização do aborto aflorou e sendo esse um tema sobre o qual sou particularmente engajada, acredito não ter o direito de me abster da discussão.

Sempre que penso sobre aborto, lembro-me do quanto sou apaixonada pela vida. Eu nasci com uma doença congênita, que fez com que, aos onze meses, precisasse realizar uma cirurgia cardíaca, para curar a lesão da minha válvula, que impedia que o sangue circulasse normalmente ao coração. Não era certo como seria minha vida após a cirurgia, e o mais comum seria que eu precisasse me submeter a novas cirurgias vezes até durante a infância, tendo em vista que válvulas artificiais têm vencimento. O mais provável não aconteceu e a minha cirurgia resistiu por mais de 20 anos.

A vida é um mar de possibilidades, basta estar vivo para entender. Todos os dias, abrimos os olhos e tudo pode acontecer. É preciso apenas que estejamos vivos.

Criminalizar ou não o aborto é falar sobre essa chance. Abortar um feto de 3 meses é tirar a chance de que aquele bebê experimente a fantástica aventura da vida. Por mais que existam estruturas familiares péssimas e que o nosso país ainda precise melhorar muito em garantir que os pais não abandonem seus filhos e que haja um acompanhamento da gestante neste desafio que é trazer à vida um novo ser humano, desistir da vida antes do nascimento é tirar a chance de outro ser humano experimentar essa extraordinária aventura.

Ah, mas a mãe é pobre e não tem condições de criar…Só porque é pobre, a melhor solução será tirar-lhe a vida, ou é a SOLUÇÃO QUE SAI MAIS BARATO PARA O ESTADO?
Mas criminalizar não irá diminuir o número de abortos. MENTIRA. Descriminalizar sim, reduzirá os riscos do aborto clandestino e dará maior conforto e tranquilidade às mulheres que assim decidirem. TAMBÉM MENTIRA.

Não existe NENHUMA PESQUISA que comprove CAUSALIDADE entre a CRIMINALIZAÇÃO RELATIVA DO ABORTO (caso do Brasil, onde o aborto é parcialmente legalizado para os casos de estupro COMPROVADO e risco à vida da gestante) e o NÚMERO DE ABORTOS praticados.

Ademais, imagine o Brasil oferecendo aborto no SUS, que maravilha? Do jeito que nossos hospitais são superequipados e bem preparados, como é todo o sistema brasileiro de seguridade social, descriminalizar abortos no Brasil é institucionalizar o aborto clandestino, com todos os seus riscos e deficiências.

Mais uma vez, o STF decide por nós, cidadãos, que não os escolhemos para nos representar. A maior prova de que essa decisão é totalmente descabida com relação a opinião predominantemente defendida como o que seria o mais justo dentro da sociedade brasileira está nos movimentos que se originaram durante os surtos de microcefalia, quando tanto instituições, como a sociedade civil defenderam a vida destes bebês com unhas e dentes, mesmo diante da má-formação do feto (hipóteses de legalização parcial do aborto ainda não acolhida no ordenamento brasileiro).

Agora, claro, existe a “elite intelectual” que se auto-empodera capaz de decidir por todos e que tem plena certeza de ser esse o melhor caminho para o país. Vimos a força dessa elite no Rio de Janeiro, na extraordinária derrota do candidato que representava essa parcela da população, em eleições municipais. Minha sugestão é que tenham o trabalho de FREQUENTAR comunidades carentes e perguntar às mães se preferem matar seus filhos ou se prefeririam ter mais estrutura para criá-los. E outra, quando discutir números em políticas públicas, saibam diferenciar entre correlação e causalidade, e aplicar as ferramentas necessárias para averiguar opções.

Descriminalizar cria mais problemas do que resolve. Agora, criar estruturas para dar apoio às famílias, aumentar as punições ao devedor de alimentos, acompanhar física e psicologicamente as mães durante sua gestação, isso sim melhora a situação do país.

*Ana Sofia Monteiro é graduanda em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e Economia pelo IBMEC-RJ, tendo trabalhado junto ao Think Tank da Pontifícia Universidad Católica de Chile em relatórios comparados sobre aborto e políticas públicas familiares. É Blackstone Fellow e também Jovem RAPS, tendo estudado Desenvolvimento Econômico na London School of Economics e Política Comparada na Universidade de Harvard, como cursos de extensão.