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Por que as mulheres estão abandonando a pílula anticoncepcional?

mao-segurando-uma-cartela-de-pilula-anticoncepcional-foto-kwangmoozaashutterstockcom-0000000000016DC4Poucas invenções empoderaram as mulheres como a pílula anticoncepcional. A história do contraceptivo está diretamente ligada à da liberação sexual e feminista, na década de 1960. Atualmente, há uma nova revolução em curso. As mulheres mais jovens e com acesso à informação estão em busca de saúde e procuram novas formas de evitar a gravidez. Elas têm questionado o uso de hormônios.

Nos consultórios, a cena se repete: a jovem, antes mesmo da primeira relação sexual, já começa a tomar o remédio. A pílula não serve apenas para evitar gravidez, ajuda a controlar problemas como a endometriose e o ovário policístico, por exemplo. Portanto, não se trata de vilanizar o remédio, mas, sim, de usá-lo corretamente e buscar alternativas.

Cerca de 100 milhões de mulheres tomam anticoncepcional, no mundo. A indústria farmacêutica investe pesado no lobby junto aos médicos para a prescrição do medicamento, que, no Brasil, é comercializado sem receita. Não há indícios de que as vendas estejam em queda no país, mas, se antes elas não questionavam o costume de usar o remédio, agora começam a fazer valer o “meu corpo, minhas regras”.

A servidora pública Tainara Monteiro, 29 anos, usou anticoncepcional durante quase 15 anos sem pausa. Depois de uma campanha promovida no trabalho sobre o uso do DIU, decidiu experimentar essa opção.

“Comecei a tomar pílula porque tenho ovário policístico. Me sentia inchada, a TPM era insuportável e tinha oscilação de peso. Os médicos diziam que eu tinha que tomar, mesmo se não me sentisse bem. Abandonar a pílula foi a melhor coisa que me aconteceu, a cura de vários problemas. Até a libido aumentou depois que parei com o remédio”, relata Tainara.

A bancária Juliana Jardim também faz parte do grupo de mulheres que resolveu dizer não ao anticoncepcional em forma de pílula. Ela começou a tomar o remédio aos 13 anos, com indicação médica, para controlar o fluxo menstrual. Só parou em outubro de 2015, aos 29 anos, quando foi apresentada pela primeira vez a outras opções. “Depois que suspendi a pílula e coloquei o DIU, tenho menos dor de cabeça, menos retenção de líquido e tenho mais facilidade para perder peso. Eu tinha uma TPM que atrapalhava até minha vida profissional. A melhora foi fantástica”, relata Juliana.

Existem dois tipos de DIU. O de cobre custa cerca de R$ 100. O hormonal é mais caro, em torno de R$ 1 mil (fora o preço cobrado pelos médicos para colocá-los). O segundo é um dispositivo intra-uterino que libera hormônio (levonorgestrel) diretamente no útero. Pode também ser utilizado para tratamento de distúrbios menstruais e na terapia de reposição hormonal. Os dois são colocados dentro do útero e impedem a passagem dos espermatozoides, não permitindo seu encontro com o óvulo.

A Secretaria de Saúde do DF oferece esse tipo de contraceptivo de graça, por meio do programa de Planejamento Reprodutivo. A mulher em idade fértil (até 49 anos) deve procurar o posto de saúde maís próximo de casa e participar de uma palestra que apresenta o planejamento reprodutivo e os métodos contraceptivos oferecidos pela rede: hormônio injetável ou oral, DIU, preservativos feminino ou masculino, ligadura de trompas e outros. Cada unidade possui uma agenda de palestras e, nelas, a mulher fica informada e escolhe o método que deseja usar.

Dados do Sistema Único de Saúde apontam que 25% das mulheres que fazem uso de contraceptivo usam pílula oral combinada, 4% contracepção de emergência, 2% minipílula (para puérperas), 3% injetável mensal, 3% injetável trimestral, 6% DIU e 0,2% diafragma.

Apesar da predominância da pílula, o cenário começa a mudar. “Sem dúvidas as mulheres estão procurando mais outros meios de contracepção, estão evitando o hormônio continuamente. Mas a formação dos médicos não é voltada para essa questão das alternativas, para temas relacionados à sexualidade, ao empoderamento”, afirma a ginecologista Thalia Maia, que faz especialização em sexualidade pela USP, atualmente.

A médica tem notado uma busca maior por opções que não sejam a pílula tradicional, que combina dois tipos de hormônios, o estrogênio e o progestagênio, hormônio sintético derivado da progesterona. “As pessoas estão se alimentando melhor, querem uma abordagem mais natural: o que sobra é DIU de cobre e outros métodos combinados, como tabelinha e camisinha juntas, por exemplo”, relata.

Vítimas
Um dos principais fatores que tem afastado as mulheres da pílula são as notícias sobre pessoas que sofreram AVC ou trombose após tomar anticoncepcional. A página Vítimas de anticoncepcionais. Unidas a favor da vidatem quase 114 mil seguidores. Foi criada pela brasiliense Carla Castro, em 2014, após sofrer trombose cerebral e três AVCs depois de usar pílula anticoncepcional por seis meses.

“Estava dando aula quando passei mal. Quando me recuperei, fiz um vídeo para contar aos meus alunos o que tinha acontecido e foram mais de 4 milhões de compartilhamentos. Comecei a receber relatos de mulheres do Brasil inteiro, por isso fiz a página para dar voz e informação a elas”, relata Carla, que recebeu mais de 8 mil depoimentos de gente que passou pela mesma situação.

Carla Castro durante a internação: três AVCs após tomar anticoncepcional receitado pela médica.

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Carla Castro durante a internação: três AVCs após tomar anticoncepcional receitado pela médica.

Carla tomou o medicamento com prescrição médica, mas nunca foi avisada sobre os riscos. Somente após o uso descobriu ter trombofilia, uma condição genética que facilita a formação de trombos no sangue. “A médica não pediu nenhum exame, só descobri quando tive os AVCs. Perdi a visão por três dias e fiquei um ano sem falar. Ainda tenho sequelas e estou processando o laboratório responsável”, diz Carla.

Ao lado da deputada federal Mara Gabrilli (PSDB), Carla luta para que o governo crie novas regras para o uso de anticoncepcional. As duas tentam criar um projeto de lei que determine a obrigatoriedade de estampar nas embalagens das pílulas aviso sobre o risco de trombose, a maior notificação dos casos de trombose em decorrência do uso de anticoncepcional e o estabelecimento de rotina de controle da venda de anticoncepcionais orais, entre outros itens.

Em 2015, Mara Gabrilli enviou um requerimento ao Ministério da Saúde, após audiências públicas com pessoas que ficaram doentes após usar a pílula, médicos e outros especialistas. O Metrópoles não teve acesso ao conteúdo da resposta enviada em 1º de julho de 2016 pelo Ministério da Saúde para esse documento.

Leia aqui a íntegra da matéria publicada pelo Metrópoles