Estamos assistindo uma situação curiosa e insólita no Brasil: o governo de turno não é de ninguém. Com a crise comendo solta, o partido pelo qual a presidente da República foi eleita e reeleita agora finge que não tem nada com isso. No seu velho oportunismo, o PT comporta-se como se fosse oposição à sua própria administração.
Os passos do descasamento entre petistas e Dilma Rousseff aprofundaram-se neste fim de semana. A presidente preferiu não ir ao esvaziado evento em que seu partido comemorou – que motivos tem para festejar? – 36 anos de fundação. Em troca, o PT divulgou um plano econômico em que refuta a possibilidade de apoiar quaisquer reformas no Congresso e defende que o país insista no caminho ruinoso que levou à recessão atual.
O mais velhaco dos mortais também já age abertamente para se dissociar de sua criatura. Lula teria avisado Dilma, segundo jornais, que não vai mais gastar saliva defendendo-a. Primeiro, porque está ocupado demais em resguardar-se das crescentes provas de que usou e abusou do poder para se dar bem e enriquecer. Segundo, porque acha que agindo assim ainda preservaria suas chances eleitorais.
A estratégia dos petistas é clara: querem tentar se desvencilhar do estrago que eles mesmos patrocinam, da roubalheira que promovem, dos retrocessos que protagonizam. De repente, não mais que de repente, é como se o partido que há quase 14 anos governa o país simplesmente não tivesse nada a ver com tudo isso que está acontecendo.
Na narrativa petista, Dilma teria abraçado o programa de seus adversários, se afastado de medidas popularescas e, por causa disso, já não mereceria a confiança dos petistas. Seria bom se fosse verdade, mas não é. A presidente continua levando seu governo com as mesmas diretrizes petistas, reprisando os mesmos erros e insistindo nos mesmos descaminhos.
Travestido de ajuste fiscal, seu mais recente conjunto de iniciativas na economia, por exemplo, aprofunda o desequilíbrio nas contas públicas. Dilma e sua equipe econômica – escolhida para agradar Lula e os petistas – divulgaram cortes, mas no mesmo momento abandonaram a meta de poupar para brecar o avanço da dívida pública.
Dilma e o PT são indissociáveis. O governo atual e sua ruína são obra deles, conjunta, e não o fruto de uma concepção de proveta, sem pai nem mãe. As ideias da presidente são as mesmas dos petistas. Ambos comungam de uma canhestra visão de mundo e compactuam com uma torpe noção da ética. São unha e carne.
Com faro invejável, os petistas já perceberam que seus dias de poder estão para acabar. Ensaiam voltar à oposição, enquanto ainda são governo. Tentam lavar as mãos em relação ao desastre atual e empurrar os ônus para os adversários. Mas não tem jeito: Dilma, a recessão, a corrupção, o desalento são todos crias do PT. Toma que a filha é tua.