Jean Tirole ganhou na semana passada o Prêmio Nobel de economia por seus estudos sobre regulação. Elas foram fundamentais na passagem de setores sob monopólio estatal para a administração privada nos anos 1990 no Brasil. A ideia principal é introduzir a competição sempre que possível e regular os mercados onde for necessário.
Há 20 anos iniciou-se a delegação das concessões de serviços públicos ao setor privado. Começou com Itamar e FHC na distribuição de eletricidade, telefonia, ferrovias e estradas. Continuou ao longo dos governos Lula e Dilma nos setores de geração e transmissão de energia elétrica, petróleo e novos modais de transportes, incluindo aeroportos.
Em grande parte dessas atividades privatizadas a concorrência é limitada, muitas delas são, inclusive, monopólios naturais onde a competição é impossível, tornando a regulação desses mercados fundamental.
Tirole nos ensina que o compromisso com a estabilidade de normas e de marcos regulatórios é uma regra de ouro
para a boa regulação. Impede que os reguladores sejam capturados por interesses de agentes privados, aumentando a concorrência e beneficiando a sociedade.
Infelizmente não é o que vem acontecendo no Brasil desde 2003, comprometendo a qualidade do processo de desestatização. O primeiro erro foi o abandono da lei que definia ritos processuais e critérios de avaliação de forma transparente. Foi substituída por decisões fragmentadas e casuísticas, permeáveis à pressão de grupos interessados.
A privatização dos aeroportos é um bom exemplo. Critérios de participação de grupos econômicos mudaram a cada rodada de leilões, culminando com um aporte bilionário do BNDES e do FGTS ao vencedor do Galeão. Essa operação, montada em tempo recorde para os padrões dos bancos públicos, modificou completamente a rentabilidade do negócio, tornando a concorrência desigual. Em nome da competição e do interesse público, os recursos deveriam estar disponíveis para todos os concorrentes antes do leilão, como se fazia no passado.
O segundo problema no modelo atual de regulação é a própria descrença na sua importância. As agências vêm perdendo paulatinamente sua autonomia financeira e técnica.
O desmonte do setor elétrico é ilustrativo. Foi facilitado porque a Aneel se comportou como braço do Executivo e não avaliou com independência os impactos da medida sobre o setor. Tivesse a agência sua autonomia respeitada, o desastre poderia ter sido evitado.
O prêmio concedido a Tirole vem em boa hora, pois recolocar a regulação nos trilhos é urgente para a expansão de investimentos em infraestrutura. O país não conseguirá retomar o crescimento sem eles. Tempo precioso já foi perdido.