Opinião

“A violência contra a mulher com deficiência”, por Mara Gabrilli

Mara-Gabrilli-foto-Gustavo-Lima-Agencia-Camara-300x196“Meu marido ficava furioso quando eu me recusava a fazer sexo e ele continuava a gritar comigo e me agarrava até eu desistir só para calar a boca dele. Ele me controlava não me deixando sair do quarto, jogando ou quebrando minhas bengalas. Certa vez, ele rasgou meu pijama enquanto eu dormia”.

O relato acima é de uma mulher canadense com deficiência física. Durante seis anos, ela sofreu de seu marido todos os tipos de abuso: sexual, emocional, psicológico e físico. Sua história reflete a realidade de inúmeras mulheres com deficiência ao redor mundo, que diariamente sofrem violência de seus parceiros, membros da família, cuidadores e de pessoas próximas.

A International Network of Women with Disabilities (INWWD), formada em 2008 e composta por organizações, grupos e redes de mulheres com deficiência em âmbito internacional, apontou que 40% das mulheres com deficiência em todo o mundo são vítimas de violência doméstica e 12% são vitimas de estupro. A pesquisa indicou ainda que mulheres com deficiência estão muito mais suscetíveis a abusos que mulheres sem deficiência. Essa violação se manifesta sob várias facetas: agressão física, compulsão legal, coerção econômica, intimidação, manipulação psicológica, fraude, negligência e a desinformação.

Há também a violência velada, cuja origem está na forma como a sociedade age (e reage) diante de uma mulher com deficiência. As pessoas não estão habituadas a encará-la como uma cidadã comum. Muita gente acredita que uma mulher com deficiência não pode ser mãe, não pode namorar ou ocupar determinada posição no trabalho. O próprio olhar da sociedade a viola.

As mulheres com deficiência ainda têm menos acesso a cuidados médicos, de saúde e reabilitação. Prova disso é a falta de equipamentos adaptados para que essa população tenha acesso a um acompanhamento preventivo contra doenças ginecológicas, câncer de mama ou mesmo fazer seu pré-natal. Não há postos de saúde acessíveis, tampouco equipamentos como mamógrafos adaptados. Ela é subtraída do acesso básico à saúde e até de um acompanhamento de sua gestação. É tolhida, simplesmente, de ser mulher em sua plenitude.

O relato de uma mulher surda, que se comunicava por meio da Língua Brasileira de Sinais (Libras) deflagra tudo isso. Sem saber que daria à luz a gêmeos, ela parou de fazer força após a saída do primeiro bebê. A enfermeira, sem saber Libras, não conseguiu dizer para que ela continuasse a fazer força. A mãe perdeu seu segundo bebê.

Recentemente, Dilma Rousseff recebeu o relatório final da CPMI da Violência contra a Mulher, e disse que utilizará suas propostas para implementar políticas de Estado no setor. Espera-se que o Governo, dessa vez, não se esqueça da mulher com deficiência, que por décadas vem sendo ignorada e excluída de diversas políticas públicas, sobretudo as de saúde, educação, trabalho e comunicação.

Este mês completaram sete anos de vigência da Lei Maria da Penha, que tem esse nome em homenagem à biofarmacêutica cearense que ficou paraplégica por conta de um tiro disparado pelo marido que freqüentemente a agredia. A violência deixou marcas indeléveis na mulher, mas foi propulsora para a luta contra a violência doméstica no Brasil.

É dever de nosso Governo, diga-se de passagem, dirigido por uma mulher, lutar não só para que a lei Maria da Penha seja cumprida em todo o país, mas que as políticas públicas, ditas sociais, olhem para a diversidade humana e em sua faceta mais vulnerável, que é a mulher com deficiência.

A discriminação com base no gênero é fruto de uma sociedade sexista e que ainda tem muito a evoluir. Mas, a violência perpetrada contra mulheres com deficiência é ainda mais nociva, cruel e precisa ser combatida.

Deputada federal (PSDB-SP)