Opinião

“Atender a todos”, por Mara Gabrilli

Mara-Gabrilli-foto-Gustavo-Lima-Agencia-CamaraPara chegar às aulas na Universidade de São Paulo (USP), a estudante com deficiência Luciana Scott contou com o transporte do Atende, serviço da prefeitura cujo gerenciamento é realizado pela SPTrans. Destinado ao cidadão com deficiência física severa, o Atende é um transporte porta a porta criado em 1996. Levada de sua casa até a USP pelas vans adaptadas, Luciana conseguiu concluir sua pós-graduação. Sua mãe, em todo final de ano, visita os técnicos do Atende para levar uma lembrança. É a forma que encontrou para mostrar a importância do serviço na vida da filha.

O Atende conta hoje com uma frota de 388 veículos, que transportam cerca de 4.300 pessoas com deficiência, além de seus acompanhantes. Essas pessoas, além de contarem com transporte para educação e saúde, que são prioridade, realizam trajetos com fins de cultura e lazer. Só em maio deste ano, foram realizadas 5.552 viagens em eventos aos finais de semana. No Carnaval, desfile de Sete Setembro, corridas de Fórmula 1 e a Feira Reatech, por exemplo, o serviço se estende ao atendimento de pessoas que vêm de fora da cidade de São Paulo.

O vínculo entre os usuários e atendentes também é intenso. Certa vez, um motorista que prestava atendimento a um casal com deficiência foi convidado para ser padrinho do casamento. A amizade perdurou.

O usuário Rogério Custódio Clemente foi além: compôs uma música agradecendo a equipe que durante anos transportou ele e o filho Júnior até o Lar Escola São Francisco, instituição que atende pessoas com deficiência.

Tais histórias exemplificam um serviço que extrapola o operacional. Demanda coração para conduzir. Daí a importância de uma cidade como São Paulo, que conta com mais de 2,7 milhões de pessoas com deficiência, investir neste transporte e ampliar seu leque de atendimento, oferecendo o serviço a pessoas com outros tipos de deficiência e que não conseguem utilizar o transporte público.

É o caso de algumas pessoas que ficam cegas e têm de reaprender a andar, a conhecer os espaços, as sinalizações, os sons da cidade… Ou crianças com autismo severo, que não conseguem estar na multidão de um ônibus ou metrô, por não filtrarem sensações que determinadas situações coletivas ocasionam.

O reconhecimento pelo serviço já foi patenteado pelo Prêmio Marca Brasil, dedicado às melhores empresas em seus seguimentos, premiando o Atende durante dois anos consecutivos (2012/2013). A votação ocorre de forma espontânea. Pela população

Por que não ampliarmos o acesso para que histórias tão promissoras ocorram na vida de mais pessoas com deficiência da nossa cidade? Apesar de possuir uma das tarifas mais caras do Brasil, São Paulo não conta com um transporte modelo que atenda às necessidades da diversidade humana.

A frota de ônibus da Prefeitura, por exemplo, que hoje conta com cerca de 15 mil carros, possui  apenas 8.500 veículos adaptados para usuários com deficiência. Essas pessoas, que muitas vezes não conseguem sair de casa, são levadas a buscar outros serviços especializados de transporte. Contudo, a grande maioria não se enquadra no escopo do Atende, que hoje só recebe pessoas com limitações severas de movimento.

Enquanto vereadora de São Paulo, acompanhei de perto tramitação do projeto de lei de minha autoria, o 639/07, que institui o programa Atende no Sistema de Transporte Coletivo da cidade, ampliando seu acesso e o tornando Lei. O PL foi aprovado em 1ª discussão em 2007, mas hoje está parado na Câmara Municipal.

O direito de ir e vir passeia por várias frentes. Sem calçada e transporte, grande parte da população está destinada a uma vida sem perspectivas de educação, saúde, trabalho, lazer, amor. A inclusão só se faz quando as pessoas com deficiência podem desfrutar de sua cidade, seus espaços, serviços e oportunidades.

*Deputada federal (PSDB-SP)