Opinião

“Sobre a importação de médicos”, por Tieza

TiezaHá alguns meses, governos do PT têm anunciado o desejo de “importar”, ou seja, trazer para o Brasil, seis mil médicos de outros países, principalmente de Cuba. Na minha opinião, mais uma vez, eles querem tapar o sol com a peneira, esquivar-se dos verdadeiros problemas e usar esse pessoal no seu projeto de poder.

Para começar, estão desrespeitando a lei. No Brasil, estrangeiro para trabalhar aqui precisa provar que tem plena capacidade e qualificação. Provando ser capaz, ele poderá trabalhar tranquilamente e gozará de todos os direitos assegurados aos brasileiros. Nos outros países também é assim. No caso dos médicos, eles fazem um exame denominado Revalida; se for reprovado nesse exame, ele não estará apto para cuidar da saúde dos brasileiros, de nenhum brasileiro, rico ou pobre. Porque sabe-se que muitos não serão aprovados, o governo Dilma está tentando inventar um “jeitinho” de trazer os seis mil médicos sem essa comprovação de capacidade, e está jogando o povo contra os médicos brasileiros e as respeitadas instituições de medicina. Porque estamos preocupados? Porque segundo o INEP – Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais, de cada nove médicos formados em Cuba (cubanos ou não), apenas um é aprovado no Revalida; em 2012, de 182 médicos formados no exterior que prestaram o Revalida, apenas 20, ou seja 10,9% foram aprovados. Então, não dá para aceitar que médicos sem comprovação de capacidade venham para o Brasil tratar dos mais pobres. Será que as autoridades públicas que querem trazê-los, irão se tratar com eles? Duvido.

Muitos médicos brasileiros não trabalham na rede pública porque o governo federal se esqueceu de investir em saúde: paga mal os médicos; os valores da tabela SUS (dinheiro que o governo federal transfere aos hospitais para remunerar médicos e custear procedimentos) são vergonhosos; há poucos hospitais e as santas casas estão agonizando; o número de leitos e de UTIs é deficitário; há deficiência na atenção básica; faltam outros profissionais na saúde; para se conseguir consulta e exames espera-se uma eternidade; é comum faltar medicamento e ver pessoas atendidas sem a menor dignidade, em locais sem nenhuma assepsia; poucas pessoas conseguem fazer as cirurgias que precisam. Se com esse cenário, os nossos médicos não conseguem trabalhar, como é que esses seis mil conseguirão? O governo vai multiplicar o número de hospitais, UBSs, de guias para consultas, de exames e cirurgias? Ora, dá para trabalhar sem essa estrutura mínima? Se isso não é uma jogada de marketing eleitoral tipo “saúde para todos” ou uma tentativa de impor modelos autoritários de governo, é uma brincadeira de mau gosto com os brasileiros.

Por outro lado, quantos brasileiros e brasileiras gostariam de cursar medicina e não conseguem porque as escolas públicas são poucas e super concorridas, e as particulares são super caras. Por que o governo, ao invés dessa atitude simplista e perigosa de importar seis mil médicos, não propõe meios para aumentar a possibilidade de acesso dos estudantes brasileiros às escolas de medicina?

E por que o governo, ao invés de trazer esses seis mil, que não falam nossa língua e terão muita dificuldade para se comunicar com nossa gente, não estimula a melhor distribuição dos médicos, dando-lhes estrutura de trabalho onde é mais gritante a falta deles? Há quem diga que o problema não é a falta de médicos mas a má distribuição deles no território brasileiro. Segundo dados do próprio governo federal, no estado de São Paulo, a taxa é de 2,3 médicos por 1000 habitantes, valor considerado muito próximo dos padrões internacionais, que é 2,5/1000. No entanto, no Maranhão, essa taxa é de 0,5/1000, número bem abaixo da média. O que esses números revelam é que falta boa vontade para garantir remuneração decente e estrutura de atendimento capaz de fazer com que os médicos escolham outros estados para trabalhar.

Também preocupa, a falta de respeito para com a remuneração dos médicos que pretendem importar. No caso de Cuba, por exemplo, o salário dos médicos é muito baixo, inferior até que a remuneração de outras profissões menos complexas no Brasil e que nem exigem tanta escolaridade. Esse fato é constrangedor. Como pode o governo brasileiro, achar atrativa a possibilidade de remunerar a menor um profissional só porque no país deles o salário é baixo? Que governo é esse que se diz combatente da exploração da mão de obra estrangeira e pretende trazer médicos de outros países para prestar serviços de saúde, em condições precárias? Isso se parece com o que temos visto acontecer com bolivianos, paraguaios, chineses e outras pessoas, que são trazidas de seus países para trabalhar, com grande precariedade, em fábricas clandestinas no Brasil.

Certamente continuaremos sem solução, porque importar médicos não é remédio para melhorar a saúde brasileira. Corremos o risco de vê-la ainda mais deficitária porque a boa medicina não depende apenas de médicos, mas de bom planejamento, de atenção à formação e trabalho médico, de políticas públicas para a saúde e de gente que sabe o valor da vida do outro e respeita o dinheiro público.

*Vereadora (PSDB/ Araçatuba–SP), presidente do Secretariado Municipal de Mulheres do PSDB de Araçatuba e representante do Legislativo no Secretariado Estadual de Mulheres do PSDB- SP