Não é a primeira vez que o Brasil se vê desafiado pelas encruzilhadas da História. Os eleitores escolherão caminhos de mudança, uns mais bem pavimentados, outros potencialmente acidentados. Manter as coisas como estão não é boa alternativa, como já está claro para a maioria.
Não é segredo para ninguém que a candidata Dilma Rousseff, independentemente das boas intenções que tenha – e as tem – embarcou num desvio que está custando caro a ela e ao país. A partir da crise de 2008, ainda no governo Lula, como ministra toda-poderosa, Dilma (e Mantega, ou sei lá quais outros ideólogos) definiram uma “nova matriz econômica” para o Brasil. Acontece que a nova matriz era velha e não produziu o feitiço esperado. Repetiu-seu erro de pensar que misturando ingredientes (gasto público solto, política monetária leniente, crédito público a mil, isenções fiscais aqui e acolá, microgerenciamento das decisões empresariais, etc) e agitando o caldeirão da política econômica, o governo asseguraria o milagre do crescimento contínuo e a felicidade geral do povo. As preocupações contrárias foram consideradas fórmulas velhas, “ortodoxas”, monetaristas, submissas ao FMI, propensas a fazer o ajuste fiscal à custa do povo.
Os resultados estão à vista e em mau momento: o das eleições. O PIB não cresce, antes se contrai e a inflação roça o teto da meta e só não o ultrapassa porque há preços artificialmente represados pelo governo; a indústria diminui de tamanho e perde competitividade e os investimentos despencam junto com a confiança das empresas no governo. Pudera, o superávit primário virou pó, apesar dos artifícios contábeis e das “pedaladas fiscais”; os bancos públicos, chamados a injetar anabolizantes creditícios na economia e a bancar o voluntarismo do governo no setor elétrico, encontram-se expostos a créditos de qualidade duvidosa, criando dúvidas adicionais sobre a situação fiscal do país; a Petrobras e a Eletrobras igualmente submetidas ao voluntarismo governamental perderam valor e capacidade de inversão; as reservas do Banco Central encontram-se comprometidas pelos swaps cambiais (quase cem bilhões de dólares) e por aí vai. Cáspite! como se dizia nas histórias em quadrinho dos anos 1940, é encrenca para não botar defeito.
Diante desta situação, o que propõe a candidata? O mesmo, com mais propaganda. Desfia um rosário de realizações, sem se dar conta de que o calo aperta na má gerência, no aparelhamento desenfreado da administração por partidos políticos, na baixa qualidade dos serviços públicos de educação, saúde e transporte e nos casos de corrupção sistêmica, nas obras inacabadas e no desperdício do dinheiro público. Ah, sim, também nos impostos que, mais do que elevados, são mal utilizados. Dá para ganhar eleições desse jeito? Mesmo Lula parece arrependido de indicar candidatos-postes cujas luzes não acendem…
Daí a responsabilidade por construir caminhos para um futuro melhor recair nos ombros das oposições que se deparam com uma encruzilhada. Um caminho aponta uma estrada pavimentada pela experiência, por realizações; outro, como se faz nos lançamentos de empreendimentos imobiliários, mostra fotos de maquetas tomadas com lentes grande angular: aparece o melhor no foco e se esfumam no horizonte as dimensões das dificuldades reais. A questão não é a foto da partida, é o percurso para levar a uma construção sólida.
Na tradição personalista de sempre (seria da política velha?), os dados eleitorais parecem mostrar a formação de um vagalhão. As intenções da candidata oposicionista são boas, mas o político, já dizia Weber há um século, não é como o pregador. A este basta a convicção e a boa palavra. Como nos Evangelhos: aquele que acreditar em mim encontrará a salvação. O político, além da crença, precisa construir os caminhos da “salvação”, que será sempre terrena e imperfeita. O desafio está no fazer e não nas palavras. Há “bons” e “maus” entre as pessoas, assim como há lados “bons” e “maus” em uma mesma pessoa. Valem as aspas porque há valores e interesses que para uns são “bons”, para outros “maus”. Além disso, na política, não se trata só de pessoas, mas do que elas representam. Na vida pública o objetivo não é somar os “bons” e alinhá-los contra os “maus”, em confronto definitivo. Trata-se de organizar forças ao redor de ideias e de interesses que, ainda que contraditórios em alguns pontos, possam se compor e formar uma maioria para governar por um período determinado de tempo em torno de objetivos claros que, se alcançados, possam beneficiar o país. A candidata Marina, se vencer, será capaz de tal proeza? Tomara, mas ainda é uma incógnita. Sem negar-lhe méritos pessoais e políticos, é recente sua conversão a algumas das teses há muito sustentadas pela oposição que não tem medo de dizer o seu nome.
Aécio representa esta oposição que vem junta há muitos anos. Sobre sua capacidade de mobilizar e coordenar equipes técnicas, organizar e liderar maiorias políticas, não cabe dúvida. Ele a demonstrou reiteradas vezes como deputado federal, presidente da Câmara e governador de Minas Gerais.
Enfim, escolheremos o caminho mais seguro ou, no embalo da velha tradição personalista, embarcaremos na direção de mares nunca dantes navegados? Embora a opção em causa seja diferente de outras que nos levaram a impasses e desastres no passado, prefiro manter-me firme ao lado de quem já passou por provas que o capacitam a governar com grandeza, com competência e a obter os apoios necessários para tirar o país do labirinto lulo-petista.
*Publicado originalmente na edição deste sábado (06/09) de o jornal El País
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