Durante 32 dias o Brasil acompanhou, com muita atenção, os acontecimentos da Copa do Mundo de futebol, desta vez realizada em nosso próprio país. Foi talvez a Copa mais bonita e mais bem-sucedida da história. Tudo graças ao povo brasileiro que, mais uma vez, demonstrou ser hospitaleiro, cordial e amável com as pessoas de todo os quadrantes do mundo que acorreram ao Brasil.
Fruto de um caldeamento racial, o povo brasileiro demonstrou toda a sua cordialidade na maneira como recebeu outros povos e outras culturas.
O evento levou o nome do Brasil a todos os continentes. Apenas usando o conceito do saudoso Nelson Rodrigues, superamos o nosso autopreconceito de vira-latas e provamos que somos capazes de sediar um evento do porte de uma copa do mundo, assim como das Olimpíadas, que virão em 2016.
Fomos capazes de garantir segurança, transporte e acomodação para os visitantes. Os prêmios distribuídos nesta Copa do Mundo são também os prêmios da população brasileira.
A festa acabou. E temos que constatar, para não faltarmos à realidade, que esta foi uma Copa de muitos improvisos e desperdícios, especialmente no campo da infraestrutura e no superfaturamento das arenas esportivas.
Quando assumimos a tarefa de organizá-la, foi feito um conjunto de promessas com relação ao legado de obras físicas que seria deixado a serviço da população: o famoso legado da Copa.
Realisticamente, precisamos constatar, ao final da Copa, que apenas uma parte pequena do que foi prometido em termos de obras de infraestrutura foi de fato entregue à população.
Em termos de transporte coletivo, pouco ou nada foi acrescentado à estrutura das cidades que sediaram jogos da Copa. E onde houve melhorias os custos superaram todas as expectativas. Em muitas cidades, as obras não ficaram prontas em tempo hábil. Onde problemas foram solucionados, o foram por meio de fórmulas que o governo muito criticara anteriormente, como a saudável privatização de diversos aeroportos. Ao invés de solução dos problemas de transporte urbano, tivemos feriados em dia de jogos. Ao invés de racionalização, tivemos a construção e a reforma de estádios faraônicos, muitos dos quais agora são grandes e caros elefantes brancos. Caros na construção e ainda mais caros na manutenção.
E a segurança pública? Durante a Copa as forças de segurança estiveram nas ruas, pelo menos no entorno dos estádios. E agora, terminada a Copa, vivemos mais seguros do que antes? Há de fato um legado de segurança pública para a população? Lamento ter que constatar que não. Nossas cidades continuam tão inseguras quanto eram antes dos jogos.
E nossos indicadores de saneamento básico, melhoraram? Nossas famílias moram em casas com tratamento de resíduos e fora de zonas de risco? Infelizmente não. Não há qualquer legado nesta área.
Passados 32 dias depois do início da Copa continuamos o mesmo país, governado de forma despreocupada e com pouco planejamento de infraestrutura urbana, de transportes, segurança, saneamento e comunicação. Continuamos a padecer dos mesmos vícios de imediatismos e descomprometimento com as tão necessárias obras de infraestrutura.
O mais grave é quando olhamos para a nossa economia. Se pensamos na inflação, temos que concordar com uma frase do economista Rodrigo Constantino, muito feliz: “Enquanto isso, a inflação dá uma goleada nos trabalhadores, destruindo o poder de compra de seu salário.”
Temos vivido um perigoso faz de conta na gestão da política econômica, com intervenções cosméticas do governo, subsídios falseadores da realidade, a criação de barreiras protecionistas e isenções fiscais oportunistas.
O que é mais grave, ainda relacionando o futebol ao quadro macroeconômico: as regras têm sido mudadas durante o jogo, levando as empresas ao desespero e deixando-as sem um horizonte definido, inibindo todo o seu planejamento de investimentos e de busca de produtividade.
Diz-se que as empresas estão usando os seus esforços mais em fazer lobby do que em busca da produtividade, que é uma arma fundamental para a inserção do país no contexto internacional.
O resultado é que, mesmo com preços represados, deveremos ter em 2014 um pibinho de 1% e a inflação superando o teto de 6,5%.
A população brasileira não pode correr o risco, agora em 5 de outubro, de perder a verdadeira copa das copas. Essa nós podemos ganhar de goleada, usando o nosso voto para virar esta página da história, elegendo um governo comprometido com os fundamentos de uma sociedade democrática política, econômica e socialmente.
*Lúcia Vânia é senadora pelo PSDB, ouvidora-geral do Senado, jornalista
**Publicado originalmente na edição de 19/07, de o Diário da Manhã