Há duas décadas, o então presidente Fernando Henrique Cardoso anunciou um marco na história da mulher brasileira. A criação da Secretaria da Mulher. A decisão colocou à frente do comando deste desafio a tucana Solange Jurema, na época procuradora do estado de Alagoas, que se viu com a imensa responsabilidade de tirar do papel e executar ações em favor dos direitos e qualidade de vida as mulheres.
Ao anunciar a medida, Fernando Henrique disse que a criação da Secretaria com status de ministério era uma “antiga aspiração”: “Eu acho que um país como o nosso já está atrasado em matéria de discutir a questão de gênero com prioridade”.
A então procuradora de Justiça de Alagoas, Solange Jurema, que presidia o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, foi a escolhida. Desde sua criação até os dias atuais, a Secretaria passou por várias transformações e muitos nomes, mas jamais deixou de existir, foi anexada a outras pastas inclusive.
Às gargalhadas
Solange Jurema costuma contar, aos risos, que estava na maternidade, acompanhando o primeiro parto de sua filha, quando recebeu um telefonema do presidente da República, convidando-a para ser a primeira ministra da mulher no Brasil.
“Eu estava na maternidade com minha filha, naturalmente nervosa, e quando estava nessa ansiedade toda, me ligam dizendo ‘o presidente quer falar com a senhora’. Achei até que era trote, porque era o dia “1º de abril”, mas depois reconheci a voz. Ele me disse: ‘Olha, Solange, amanhã eu vou anunciar a criação da Secretaria de Estado com status de Ministério, e gostaria que você estivesse aqui, porque vou anunciar os novos ministros’”.
Naquele momento, Solange Jurema disse que reagiu rápido: “Presidente, sinto muito. Fico muito honrada com o convite, muito feliz, mas não posso sair amanhã. Minha filha está tendo menino a essa hora, hoje, e não posso deixar a minha filha. Infelizmente, mãe é insubstituível, e ministro não é’”, disse.
Segundo a tucana, Fernando Henrique não conteve a gargalhada. “Aí ele deu uma gargalhada e disse: ‘é questão de gênero, não é, Solange?’. E eu disse ‘é, presidente, é uma questão de gênero. Não posso deixar a minha filha’. Mas ele anunciou, o meu nome e a criação do ministério. Ficou todo mundo me procurando na solenidade e eu não estava lá”, divertiu-se a tucana.
Desafios
A tucana disse que no comando da pasta seu maior desafio foi o de montar um ministério consolidado em apenas um ano, de forma que não fosse desarticulado pelo governo seguinte. Ela disse que teve apoio de uma equipe comprometida e técnica, da Bancada Femina do Congresso Nacional, partidos políticos e movimentos feministas. Porém, segundo Solange Jurema, a principal incentivadora e aliada foi Dona Ruth Cardoso.
Como resultado, a tucana disse que conseguiram compilar o primeiro relatório que catalogava a situação das mulheres brasileiras em diversos setores, como saúde, educação e violência.
“Demos início a uma grande capacitação daqueles que compunham as Delegacias Especiais das Mulheres. O objetivo era dar uma resposta ao que as mulheres mais reclamavam, a falta de respeito, insinuações maldosas, além de serem maltratadas rotineiramente. Chegavam violentadas, apanhadas, estupradas, e às vezes ainda sofriam outro tipo de violência nessas delegacias”, afirmou.
Em seguida, Solange Jurema acrescentou que: “A gente também aumentou muito o número de casas abrigo para as mulheres, porque elas sofriam, apanhavam e terminavam sendo mortas, como a gente vê ainda hoje, se elas não têm para onde ir ou um apoio maior”.
Ações
Para a tucana, é fundamental destacar as ações políticas desenvolvidas pela pasta: apoio das Nações Unidas para desenvolver a formulação de estratégias para governabilidade em gênero; proposta dirigida ao Presidente visando a implantação de política de transversalidade em gênero nos diversos ministérios; parceria com o Sebrae para apoio às micro e pequenas empresas dirigidas por mulheres.
Também devem ser incluídas ações afirmativas para capacitação de mulheres nas atividades rurais; articulação suprapartidária com a bancada feminina no Congresso Nacional, com o objetivo de fortalecer a rede legal em defesa da mulher; articulação com o poder judiciário para promover a participação feminina nos Tribunais Estaduais e Federais;
Por fim, a coordenação de ações específicas em prol das mulheres negras e indígenas com o objetivo de combater a discriminação e promover o acesso às esferas de poder; articulação junto ao Congresso Nacional para a ratificação do Protocolo Facultativo à Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher, que permitiu às brasileiras poderem recorrer à Justiça Internacional; participação do Conclave Internacional na ONU, em Nova York, para avaliação do Encontro Mundial de Mulheres, realizado em Pequim/1995; Coordenação como Presidente Pro-Tempore da Reunião Especializada do Mercosul para analisar a situação da mulher na América Latina, em parceria com o Itamaraty.
De acordo com Solange Jurema, a Secretaria da Mulher também colaborou para a indicação e posterior nomeação da primeira mulher para compor o Supremo Tribunal Federal, Ministra Ellen Grace.
*Com informações do site do PSDB Mulher e da Folha de S. Paulo.