Esse filme recente traz, ambientado em 1939, o desenvolver de relações que levaram a se concretizar na Alemanha um terrível regime totalitário. Foram forçados a fugir do país cientistas como Sigmund Freud, emigrando para países onde a liberdade era garantida e valorizada. O filme, muito bem elaborado, tem roteiro que abarca muitas facetas de um mesmo evento: o aprendizado de um jovem na busca de sua própria realização.
Que sonhos têm aqueles que aos milhares respondem a uma convocação pelas redes para participar de mais uma manifestação, como tem acontecido em várias partes do mundo? Multidões tomam as ruas nas cidades criando uma rotina de livre participação. Vai quem quer, na imensa maioria jovens, para se posicionar sobre os temas do dia. Aqui as manifestações se sucedem em continuidade às primeiras grandes manifestações de 2013, quando os temas eram outros, bem focados, e que desembocaram em mais um impeachment presidencial.
Algumas inclusive escolhem para seu motivo o impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal, que tem sido levados a definir o que pode ou não ser feito em todas as áreas de convívio da nossa sociedade dividida. Legislam – função que deveria estar sendo exercida pelo Poder Legislador: o Congresso Nacional.
Para minha tristeza na Venezuela, só violência e incompletude. Zeitgeist. O Espírito do Tempo. Cabe principalmente à filosofia e à religião perguntarem de onde viemos e para onde vamos. Poucos refutam as evidências de que estamos vivendo melhor hoje do que já vivemos no passado. Temos liberdade e democracia, temos remédios para (quase) todas as doenças, vivemos mais, os níveis de miséria e pobreza absoluta em média se reduziram, as revoluções agrícolas tem permitido a produção de alimentos que espantam a fome Malthusiana, as revoluções industriais tem criado produtos novos que tiram o peso do trabalho braçal substituindo-o por máquinas.
Problemas, bem, claro, são muitos, e graves também: há insegurança, tiroteios, violência e terrorismo, matam pessoas na nossa frente, em tempo real. A riqueza gerada por essas revoluções tecnológicas e econômicas distribuem o peso do que vai mal de modo muito desigual. Mas se melhorou, por que tanta revolta?
O psicanalista Jorge Forbes (TerraDois, TV Cultura) explica como o jovem de hoje, que tem tantas opções para a sua tomada de decisões, ao escolher uma delas não sente que tenha ganhado com ela e, sim, sente ter perdido as dezenas alternativas. Com isso se gera um mal-estar por estar neste mundo. Mas uma coisa é o racional. Outra é o sentimento que se tem frente às coisas objetivas, concretas, como as melhoras relativas que citei. É a emoção que modela as expectativas, o futuro que se deseja.
Nas sociedades do bem-estar do Século XX foi responsabilidade dos governos buscar o aumento e a qualidade desses serviços. Produzi-los e distribuí-los custa, e as finanças públicas não aguentam ampliar o acesso a esses direitos. Em toda parte, rompe-se a confiança entre os governos e os governados, tendo a corrupção como sintoma maior desse rompimento. Crises sucessivas geraram sempre manifestações populares.
Países que prezam a estabilidade devem buscar financiar de modo sustentável aposentadorias, saúde e educação de qualidade, segurança pública, para todos. Inclusive para imigrantes, nas novas levas que chegam à Europa e Estados Unidos principalmente. Aumenta o número de cidadãos que reagem reativando movimentos e partidos de extrema direita que durante o crescimento mundial da era da globalização estiveram adormecidos.
Bons livros mostram a evolução nos comportamentos das pessoas que já incorporaram geneticamente em seus cérebros a vivência de seus antepassados, e que seguem na sua vez fazendo mais rápido o que os pioneiros faziam a seu tempo. Evolução. Vale ler. Correta ou incorreta a grita, o certo é que esses jovens já não vivem no mundo do papel, dos recibos.
Dificilmente vão carregar esses três livros que dão uma estrada para entender o mal-estar do século XXI. A neurociência e a biociência mostram que o cérebro vai mudando fisicamente de geração para geração, incorporando geneticamente o aprendizado dos que vieram antes. Mas o mal-estar segue de uma época para outra. Tudo que é sólido de desmancha no ar. Mundo líquido. Não dá para acompanhar tudo…
Querendo ou não, somos responsáveis pelo que ajudamos a construir com as nossas escolhas do passado, assim como os mais jovens são responsáveis pelo futuro que constroem a partir das suas escolhas de hoje. O tempo não para. A tecnologia que ajudamos a criar tomou velocidade e rumos próprios.
*Yeda Crusius é presidente Nacional do PSDB-Mulher, ministra do Planejamento no governo Itamar Franco (1993), governadora do RS (2007/2010) e deputada Federal por quatro mandatos.