De lá para cá já se passaram mais de 16 anos e não se sabe se algo semelhante aconteceu no mundo. E até hoje algumas pessoas se surpreendem com as fotos. Outras se chocam. A verdade é que a beleza e a capacidade das mulheres com deficiência ainda são camufladas por várias formas de violação.
Para se ter uma ideia, cerca de 10% das mulheres do mundo vivem com uma deficiência. Nos países mais pobres, 75% da população com deficiência é do sexo feminino. No Brasil, de acordo com o Censo de 2010 do IBGE, cerca de 25 milhões de mulheres possuem algum tipo de deficiência – e quase um terço delas são negras. Ou seja, carregam uma somatória de discriminações.
Estudos de organizações que tratam o tema da mulher no mundo apontam que 40% das mulheres com deficiência são vítimas de abuso e 12% de estupro. No Brasil, essa realidade não é diferente. As brasileiras com deficiência são vulneráveis a violência manifestada sob várias facetas: agressão física, compulsão legal, coerção econômica, intimidação, manipulação psicológica, fraude e negligência.
Há também a violência velada, cuja origem está na desinformação da sociedade. Muita gente acredita que uma cadeirante não pode ser mãe, não pode namorar, trabalhar, ocupar determinada posição na sociedade. No mercado de trabalho, por exemplo, a desvantagem permanece, pois a mulher com deficiência ainda ganha menos que o próprio homem com deficiência.
Essa cidadã ainda tem menos acesso a cuidados de saúde e reabilitação. Prova disso é a falta de equipamentos adaptados nos postos de saúde para a realização de um pré-natal ou exames preventivos contra doenças ginecológicas e câncer de mama.
A falta de sensibilidade e de treinamento adequado dos profissionais também violam direitos. O relato de uma mulher surda, que se comunicava por meio da Língua Brasileira de Sinais (Libras) deflagra esse despreparo. Sem saber que daria à luz a gêmeos, ela parou de fazer força após a saída do primeiro bebê. A enfermeira, sem saber Libras, não conseguiu dizer para que ela continuasse a fazer força. A mãe perdeu seu segundo filho.
Na Lei Brasileira de Inclusão (LBI), projeto que relatei na Câmara dos Deputados – em vigor desde janeiro de 2016 -, fizemos questão de garantir que as unidades básicas de saúde tenham não só equipamentos acessíveis, como mamógrafos e macas para mulheres cadeirantes, mas também intérpretes de Libras para prestarem atendimento ao público com deficiência auditiva.
Quando falamos de prevenção é fundamental que exista informação adequada e acessível para todas as pessoas. Isso inclui a população com deficiência, seus familiares e cuidadores, que também devem ter acesso sobre condições de saúde, autonomia e qualidade de vida.
O texto da LBI ainda assegura atenção integral à saúde da pessoa com deficiência por intermédio do SUS, inclusive o direito à fertilização assistida. Afinal, toda a mulher tem o direito de expressar seus direitos sexuais, reprodutivos e civis, como casar e ter filhos.
Quando a mulher com deficiência encontra acesso aos serviços necessários para uma vida digna e saudável, ela pode contemplar a plenitude de sua feminilidade. Pode ser mãe, profissional e o que mais desejar. A deficiência não a impede de fazer nada. Esta quem vos fala é prova prática disso.
Nesta era, em que se fala tanto em sororidade, unamos nossas capacidades, experiências e, fundamentalmente, atitudes, para colocarmos nossos direitos em prática. A discriminação com base em gênero é fruto de uma sociedade sexista, com traços de misoginia, e que tem muito a evoluir. Mas quando ela é dirigida especificamente à mulher com deficiência só retrata a faceta mais nociva e atrasada de uma nação.