O Brasil mantém-se como o campeão do ranking mundial de juros. Com o tímido corte promovido pelo Comitê de Política Monetária (Copom) na semana passada, que reduziu a Selic para 13,75% ao ano, o país passou a ter uma taxa real, ou seja, já descontada a inflação, de 8,5%. Não há lugar algum do planeta em que haja qualquer coisa assemelhada a isso.
Segundo levantamento feito pela consultoria Infinity, a média dos juros reais nas 40 principais economias do mundo situa-se atualmente em 1,9% negativo. Segundo lugar na lista encabeçada pelo Brasil, a Rússia tem taxa real de 4,5%, isto é, quase a metade do patamar brasileiro. O espaço para sair cortando é imenso.
O que leva o Brasil a ter taxas tão absurdas é sua deprimente condição fiscal. A dívida pública como proporção do PIB vem em escalada nos últimos anos, com alta de cerca de 20 pontos desde 2013. País muito endividado é obrigado a pagar caro para captar recursos. Sem a aprovação da PEC da responsabilidade, com imposição de um teto para os gastos do governo, a trajetória corre risco de ser ainda mais explosiva.
Na realidade, o Copom encontra-se hoje diante de uma janela de oportunidade para baixar os juros. Desta vez, diferentemente do que aconteceu na gestão petista, não será necessário nenhum porrete. Isto porque, depois de anos indomada, a inflação caminha para ficar comportada e acomodar-se nos limites estabelecidos como alvo da política monetária, com perspectiva razoável de convergir para a meta já em 2017.
Crise mais braba e desemprego ainda em ascensão estão ajudando a segurar os preços. “O processo contínuo de distensão do mercado de trabalho e a desaceleração significativa da atividade econômica tendem a produzir desinflação que pode vir a ser mais intensa que a refletida nas expectativas de inflação medidas pela pesquisa Focus e nas projeções condicionais produzidas pelo Copom”, analisa ata divulgada nesta terça-feira pelo Banco Central.
Em estudo recente, Felipe Salto mostrou que, mesmo com a Selic estacionada, processo que durou 15 meses e só foi interrompido em outubro, a taxa real brasileira sofreu brutal aumento desde fins de 2015. A partir de setembro daquele ano, as expectativas de inflação começaram a declinar e apenas recentemente a taxa básica foi cortada, em 0,5 ponto percentual. Resultado: os juros reais aumentaram dois pontos neste período.
Isso significa que, à medida que a recessão foi sendo aprofundada, a política monetária foi se tornando mais restritiva, na contramão do que o país precisaria. Juros altos têm como consequência o represamento dos investimentos, a restrição do consumo e o encarecimento do crédito – todos, portanto, combustível para incinerar ainda mais uma economia em estado já anêmico.
Não se espera que agora o governo Michel Temer repita a política irresponsável e voluntarista levada adiante pela ex-presidente Dilma Rousseff entre 2011 e 2013. Naquela ocasião, com o consumo aquecido, o Banco Central foi forçado a reduzir a taxa básica – no que foi seguido, em especial, pelos bancos públicos – e impulsionou ainda mais a demanda numa economia que já estava com a oferta garroteada.
Era a fórmula com que a alquimia petista contava para manter a roda da atividade girando e para preservar na população a sensação de prosperidade que alimentaria a reeleição de Dilma. A consequência foi o descontrole da inflação – que em alguns meses bateu nos piores níveis desde o Plano Real, fechando em 10,67% no ano passado -, a implosão das contas públicas e a completa desestruturação da economia nacional.
Agora, com risco pequeno de alta do índice de preços e a certeza de que a crise caminha muito pior do que se previa, o remédio da queda dos juros tornou-se a a mais sensata alternativa de política econômica à disposição do governo brasileiro. Enquanto as reformas não vêm, derrubar a Selic transformou-se na bala de prata que resta para começar a alvejar o monstro da recessão.