A perplexidade com o resultado, conhecido por volta das 5h30 desta madrugada, envolve todo o mundo – até mesmo o vencedor transparecia surpresa no discurso que fez logo depois… A primeira reação generalizada é de temor, uma vez que a retórica do republicano carrega tudo o que a comunidade global não gostaria de – nem precisava – ver e ouvir neste momento.
A plataforma de campanha de Trump foi construída com base no fechamento das fronteiras dos EUA ao livre-comércio, postura belicosa em relação a alguns grupos e nações, restrições à imigração e confronto a consensos como o do aquecimento global e da igualdade de direitos de gênero e raça. Alguns já afirmam que a vitória dele pode marcar o início de uma nova era histórica – pior que a atual.
A despeito disso, Trump vai governar a maior democracia do mundo, com instituições sólidas e um consolidado sistema de freios e contrapesos, o que deverá dosar o ímpeto dessa agenda. Além disso, embora os republicanos tenham mantido maioria no Congresso, o presidente eleito não conta com apoio automático de muitas de suas lideranças e precisará fazer ajustes entre suas próprias bandeiras e as de seu partido.
Para o Brasil, o triunfo do republicano chega em momento de crise. A política e a economia brasileira não mereceram atenção alguma de Trump na campanha e pode continuar assim – nem com o democrata Barack Obama vinha sendo diferente.
Dado o discurso francamente protecionista de Trump – um dos principais pilares de sua campanha -, pode ficar mais difícil para as empresas brasileiras vender e fazer negócios lá fora. Nossas exportações para os EUA, que no ano passado já haviam diminuído 12,2% em relação à máxima histórica, anotada em 2008, podem a cair mais. Outros mercados, como a China, hoje nosso principal comprador, também serão afetados.
Com os EUA mais reticentes à globalização e o resto do mundo mais temeroso em relação aos destinos do globo, o empuxo que poderia vir do exterior para ajudar a economia brasileira a deixar para trás a recessão pode perder força. A alta de 1% do PIB nacional com que o ministro Henrique Meirelles conta para 2017, conforme manchete da edição de hoje do Valor Econômico, dependerá ainda mais da remada de todos nós do que um eventual vento a favor vindo de fora.
A eleição de Donald Trump obriga uma mudança de patamar no grau de urgência das mudanças necessárias no Brasil. Se antes já era preciso barrar o aumento de gastos, agora é obrigatório fazer isso o quanto antes. As reformas para retomar o desenvolvimento são inadiáveis. Não resta ao Brasil outra alternativa senão ser muito mais incisivo na guinada por um país com mais responsabilidade fiscal, emprego, eficiência e produtividade, e menos desperdício, privilégios e desigualdades.