A Lei de Responsabilidade Fiscal é uma das principais conquistas da sociedade brasileira nas últimas décadas. Instituída em 2000, impôs aos governos o que deveria ser uma regra básica, mas no Brasil jamais fora: só se pode gastar o que se arrecada, sob pena de rigorosas punições. A LRF veio para colocar o interesse público em primeiro lugar.
A lei funcionou bem enquanto tínhamos governos de boa-fé, mas, infelizmente, mostrou-se incapaz de resistir a gestões que tomaram o Estado brasileiro de assalto. Seus preceitos vêm sendo arrombados desde que o governo do PT – partido que desde sempre se bateu contra a responsabilidade fiscal – converteu a criatividade em atributo contábil.
O resultado foi a quase insolvência do Estado brasileiro, a explosão da dívida pública, que saltou da casa dos 50% do PIB para algo próximo de 70%, e o rebaixamento do crédito do país por todas as agências de classificação de riscos. Felizmente, uma presidente da República está pagando com o mandato por ter produzido tamanho estrago.
O aprofundamento da discussão sobre os orçamentos públicos, a iminente reforma para instituir o teto de gastos, a constatação de que as vinculações constitucionais praticamente paralisam os governos e a quebradeira generalizada em estados e municípios colocaram a necessidade de restaurar a responsabilidade fiscal novamente no centro dos debates.
É preciso robustecer a LRF, fechar as brechas que permitiram as irregularidades verificadas nos últimos anos, cuja expressão mais evidente são as chamadas “pedaladas fiscais”, e apertar o torniquete sobre os gestores públicos. A regra deve ser rigorosa para punir quem não respeita o dinheiro que deveria servir ao povo, mas acaba servindo a apenas alguns.
A necessidade de aperfeiçoar a LRF é consentida até pelos seus artífices. E nem é recente. Já houve movimentos neste sentido, como a iniciativa do senador Tasso Jereissati em 2010. É preciso retomar esta agenda.
O rol de aperfeiçoamentos começa pela imposição de limites para o endividamento da União, previsto na lei original, mas jamais instituído. Há, no Congresso, projeto do senador José Serra dispondo a respeito e pronto para ser levado a votação.
Completam a lista propostas que visam regulamentar orçamentos e a contabilidade pública, responsabilizar empresas estatais, disciplinar fundos de pensão, impor a responsabilidade fiscal aos estados e criar um conselho de gestão fiscal, conforme elencam José Roberto Afonso e Felipe Salto em artigo publicado ontem n\’O Estado de S. Paulo.
A LRF não é panaceia, nem obra pronta e acabada. Seu maior mérito foi formar uma nova cultura na administração pública e na sociedade, com mais transparência e interesse sobre as contas públicas. As manipulações, erros e burlas recentes apenas reforçam a importância de impor travas ainda mais robustas a quem não trata o dinheiro do povo com o respeito que ele merece.