“Lembro de uma situação que aconteceu quando tinha 18 ou 19 anos. Comecei um estágio em um órgão público e rapidamente meu chefe criou uma intimidade estranha. Achava esquisito, mas não sabia como fazê-lo parar de fazer comentários sobre sua vida sexual. Até que, poucos meses depois da minha entrada na empresa, me prensou contra a parede e tentou me beijar à força. Saí de lá correndo e nunca mais voltei. No dia seguinte, comecei a me culpar por ter deixado aquilo acontecer. Não contei para ninguém e ainda levei uma bronca do meu pai, que ficou com medo que eu não parasse em emprego nenhum”, diz a senadora Simone Tebet (PMDB).
“Havia em meu bairro um senhor de boa reputação. As pessoas gostavam dele. Este senhor sempre nos observava quando estávamos brincando. Em certa ocasião, ele começou uma conversa comigo sobre questões que, só mais tarde percebi, eram muito íntimas para uma conversa entre um adulto e uma criança. Bem nesta hora, minha mãe me chamou e eu voltei correndo para casa. Tenho uma sensação ruim quando lembro disso”, declara Maria do Rosário (PT).
“Eu tinha nove anos. Era meu primeiro baile de carnaval e estava acompanhada dos meus pais e meu irmão. Um jovem desconhecido chegou por trás e passou a mão em mim. Acertei-lhe um tapa e ele saiu logo em seguida”, afirma a deputada Mara Gabrilli (PSDB).
“Fui estuprada aos 7 anos, mas quero falar sobre assédio no ambiente de trabalho. Logo que cheguei à Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro, sofri muito assédio por parte dos homens que achavam que eu, mulher e negra, estava deslumbrada com o ambiente e me viam como um objeto sexual”, relembra a senadora Benedita da Silva (PT).
“Lembro que foi no início da minha adolescência. Estava em um ônibus lotado, na minha cidade natal (Fortaleza), quando de repente percebi que havia um homem que propositalmente buscava um contato, pressionava o corpo contra o meu corpo, e forçava um atrito. Ao perceber que era algo proposital, protestei e mudei de lugar. Era muito nova, não entendi direito o que ele estava fazendo. Continuei a andar de ônibus, e eles eram sempre lotados. Foi o primeiro, mas não o último em ônibus”, conta a deputada Erika Kokay (PT).
“Toda mulher tem ao menos um episódio de assédio, de sofrimento, em que tenha se sentido desrespeitada. Embora eu não tenha nada mais violento para relatar, felizmente, posso dizer que já fui vítima de comportamentos machistas, como cantadas grosseiras que o brasileiro costuma naturalizar, tratar como algo que faz parte do relacionamento entre um homem e uma mulher. Não faz! As famosas cantadas revelam a cultura de desrespeito à mulher, que segue sendo tratada com objeto, propriedade dos homens. Então eu poderia citar vezes em que, ainda adolescente, com 14 ou 15 anos, vivi o constrangimento de ouvir coisas grosseiras”, diz a senadora Angela Portela (PT).
“Infelizmente todas as mulheres que conheço possuem em seus repertórios histórias de assédio nos mais variados níveis. Comigo não seria diferente. Escolhi, para compartilhar com vocês, um episódio que, embora não tenha sido um primeiro assédio, teve (e tem até hoje) um impacto forte porque aconteceu quando eu me julgava já independente e autônoma. Eu era estudante de Engenharia Elétrica na UFPE e estava na Bahia, em uma atividade do movimento estudantil. Ao sair da casa em que estava hospedada um carro diminuiu a velocidade e pareceu me chamar, olhei para o motorista que pediu que eu levantasse a minha camisa. Tomei um choque! Perguntei se ele era louco e busquei me afastar dali. O carro me seguia, acompanhando o meu passo apressado e o motorista gritava que era de uma revista, e me chamava, tentava me atrair enquanto eu apavorada só pensava em encontrar um lugar onde houvesse mais pessoas que me salvassem daquele pânico. O porto seguro foi um ponto de ônibus lotado um pouco mais a frente. O carro sumiu, mas meu medo não. Fiquei com receio da voltar para casa, onde estava hospedada sozinha, e o carro me seguir de alguma forma. Pensava se ele tinha me visto sair de casa e se estaria de algum modo esperando que eu voltasse. Quando consegui voltar para casa até o toque do telefone me assustava, achava que aquele homem de algum modo poderia continuar me perseguindo. Curioso como o medo nos torna irracional! A paz e a segurança só voltaram depois de uma conversa com meu pai por telefone. Só as palavras daquele que me apresentou ao feminismo, que me presenteou com as ideias da Alexandra Kollontai, foram capazes de me devolver a serenidade e espantar de vez a sensação de fragilidade que aquele carro na rua deserta me inspirou”, relata a deputada Luciana Santos (PCdoB).
Maria Laura Neves, Dolores Orosco e Letícia González
*Publicado na revista Marie Claire em 09 de dezembro de 2015