Como já fiz antes, recebo esta responsabilidade como uma oportunidade para refletir sobre o Brasil, respeitando as diferenças de pensamento e os princípios democráticos, sem, no entanto, me omitir diante dos graves problemas que dominam o quadro político nacional.
Certo é que, desde a minha última coluna, em junho de 2014, a nossa situação se agravou muito.
Há hoje, dispersa, uma sensação preponderante de que o país vai mal e piora. São visíveis as contradições do governo central e seu crescente distanciamento da realidade.
Fatos consumados, como o aumento do preço da energia, da gasolina, de impostos e dos juros; o flagrante descrédito internacional; a inflação que torna mais custosa a sobrevivência; a precariedade dos serviços públicos, em especial da segurança e do atendimento à saúde, além da tentativa de, sem qualquer diálogo com a sociedade, cortar direitos dos trabalhadores –medida feita justamente pela presidente que disse que jamais o faria– geram forte indignação e tornam o cenário ainda mais delicado.
A esta altura, o governo não tem respostas para suas próprias incoerências e vive grave paralisia diante das múltiplas crises –de gestão, econômica, política e ética. Ao final, são problemas demais e providências de menos, confirmando a ausência de rumo.
A inquietação e o temor pelo futuro se traduzem no risco evidente da perda de conquistas importantes, como a estabilidade econômica e os avanços sociais. Está claro que as grandes causas nacionais foram deixadas pelo caminho.
As oposições no país têm consciência dos seus deveres, enormes e intransferíveis. Sabem que é crucial impedir que se fragilizem as instituições e que se coloquem em risco a democracia, a liberdade e os direitos de cada cidadão.
Nunca as atenções estiveram tão voltadas para o mundo político, mas a verdade é que quem estiver olhando só para ele não terá uma visão completa da realidade.
Um outro protagonista está assumindo, cada dia mais, um papel relevante: o sentimento do povo brasileiro, que começa a transbordar nas conversas em casa, nas ruas, no trabalho.
Ele reflete inquietude, que pode gerar mais participação e responsabilidade coletiva. Sinaliza a existência de um povo se apropriando do que lhe pertence: o seu presente e os rumos do seu futuro.
Neste trecho de história, diante de tudo o que está acontecendo, essa é a melhor notícia.
AÉCIO NEVES escreve às segundas-feiras nesta coluna.
*Publicado na edição desta segunda-feira (02/03) em a Folha de S.Paulo