Brasília (DF) – Ao completar 70 anos, a ex-ministra de Assistência Social do governo Fernando Henrique Cardoso, a educadora Wanda Engel faz planos para o futuro e emana entusiasmo. Filha de pai mecânico e imigrante alemão com mãe paraense, a professora condena a ausência de projetos que hoje impera no país. Segundo Wanda Engerl, é preciso ter perspectivas para avançar e realizar sonhos.
Na sua trajetória, Wanda Engel sabe o que é traçar metas e concretizar, pois além do governo federal, participou da Divisão de Desenvolvimento Social do Banco Interamericano de Desenvolvimento, foi conselheira do Educar para Crescer e atualmente é Coordenadora do Grupo de Parceiros Estratégicos do Pacto pela Educação do Pará (GPEP).
“O segredo é ter planos, um projeto, ou melhor dizendo um conjunto de projetos que se sucedam. Ter um futuro. Acho que é isso o que afeta os mais pobres e o próprio país. O Brasil está sem projetos, sem sonhos de futuro ou perspectiva de realizar algum plano”, ensinou a educadora que não esconde a alegria de viver e concretizar ideias.
Em entrevista exclusiva ao PSDB Mulher, Wanda Engel contou que sua história de vida é baseada na superação de dificuldades. De acordo com ela, a educação foi a base de tudo na sua vida e na sua família.
Wanda Engel relatou que mesmo quando seu pai adoeceu e a mãe se viu obrigada a sobreviver com um salário, a família não abriu mão da educação para ela e a irmã. “Fui aprovada no dificílimo processo de seleção do Instituto de Educação [do Rio de Janeiro], e o destino da família passava a estar ligado àquela incrível escola”, relembrou.
A seguir, os trechos da entrevista de Wanda Engel ao PSDB-Mulher.
PSDB-Mulher – Qual o segredo para manter-se jovem, física e mentalmente numa fase da vida em que as pessoas, normalmente, começam a desacelerar a agenda?
Wanda Engel – O segredo é ter planos, projeto, melhor dizendo, um conjunto de projetos que se sucedam. Ter um futuro. Acho que é isso o que afeta os mais pobres e o próprio país. O Brasil está sem projetos, sem sonhos de futuro ou perspectiva de realizar algum plano.
PSDB-Mulher – O Brasil está invertendo sua pirâmide etária, que aponta para um envelhecimento da população nos últimos trinta anos, estamos nos preparando para essa nova realidade?
Wanda Engel – Na verdade, estamos vivendo duas realidades; o envelhecimento da população, citado por você, e a iminência de viver, nos próximos anos, a maior onda jovem que já tivemos. Teremos duas necessidades demográficas. Apenas 50% dos jovens termina o ensino médio e vivemos, atualmente, em uma sociedade do conhecimento, que exige pelo menos o ensino médio para absorver nossos jovens no mercado de trabalho. Caminhamos, portanto, para desperdiçar a metade desse enorme potencial dessa imensa onda jovem, que será condenada ao subemprego ou ao desemprego, por nosso descaso e falta de previsão.
Na outra ponta da pirâmide, não nos preparamos nem para os gastos que o aumento do número de idosos vai causar à previdência social ou ao sistema público de saúde, o legado negativo do envelhecimento de nossa população. Tampouco nos preparamos para o aspecto positivo do aumento do número de idosos, que é o imenso potencial de trabalho desse grupo. Não estamos preparados nem para atender às necessidades decorrentes do envelhecimento da população, nem para fornecer aos jovens o passaporte mínimo para o mercado de trabalho.
PSDB-Mulher – Não é sempre que se vê uma trajetória de vida como a sua; maior exemplo do que uma educação básica de qualidade pode fazer pelas crianças oriundas de famílias mais pobres. Ainda é possível driblar as dificuldades iniciais da vida como a senhora fez?
Wanda Engel – Acho que está cada vez mais difícil seguir meu exemplo, pela qualidade da educação pública oferecida hoje aos mais pobres. Eu tenho consciência que não teria chegado aonde cheguei sem a ajuda do Instituto de Educação, referência de ensino público de qualidade em minha época, onde ingressei no ensino básico. Hoje o número de boas escolas públicas, que forneçam uma educação de excelência às crianças mais pobres, é absolutamente ineficiente.
PSDB-Mulher – A senhora foi ministra-chefe da Secretaria de Estado de Assistência Social do governo Fernando Henrique Cardoso. Pode-se dizer que implantou todos os programas sociais que, no governo seguinte, foram reunidos e unificados sob o rótulo “Bolsa Família”, como foi o começo de tudo?
Wanda Engel – O governo Fernando Henrique criou os programas de benefício de prestação continuada. Antes dele, os programas de assistência e transferência de renda não tinham condicional, bastava ser pobre para ter acesso. Primeiro criamos o PET – Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, logo seguido do Bolsa Escola, que começou em Campinas e foi federalizado em 2000. Em 2001 foi criado o Fundo da Pobreza e o Programa Alvorada, que expandiu bastante o alcance dos programas de transferência.
Chegamos ao final de 2001 com todas as faixas etárias infantis cobertas e percebemos a necessidade de implantar um cadastro único de todas as famílias pobres atendidas. Outro programa nosso, o Auxílio Gás, foi decisivo para o cadastramento, dada a sua enorme abrangência. Chegamos a 2003 com sete milhões e meio de famílias cadastradas e quando o segundo governo Fernando Henrique terminou, as raízes da unificação de nossos programas estava lançada, apenas não houve tempo hábil para finalizá-la. O governo Lula apenas unificou e rebatizou programas já existentes.
É muito fácil comprovar a autoria dos programas, porque a curva da descida da desigualdade social brasileira começa em 2001, não em 2003 como se pretende hoje. As bases técnicas para isso foram dadas por nós.
PSDB-Mulher – Estamos conseguindo combater a evasão escolar de maneira eficaz? E o trabalho infantil?
Wanda Engel – Nenhum dos dois. O trabalho infantil teve uma forte queda com a implantação do PET, considerado o mais exitoso programa de erradicação do trabalho infantil do mundo, na época. Atualmente esta queda estacionou em um patamar que mostra claramente a necessidade de mudança do modelo adotado. Mas o que não estamos conseguindo combater mesmo é a evasão escolar do ensino médio.
Enfrentar a evasão escolar está no centro da solução do problema brasileiro. Eu diria que o foco de atenção capital no programa do PSDB deveria ser um choque de gestão no ensino médio. Temos que estabelecer um nexo entre educação e trabalho em nossos jovens já no ensino básico.
Atualmente as empresas estão desesperadas para contratar, querendo investir na formação de seus empregados, mas como fazer isso sem que os jovens estejam preparados?
PSDB-Mulher – De acordo com dados do Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos), o país piorou em leitura e empacou em ciências. No ranking do Pisa estamos em 55º lugar em leitura; 58º em matemática e 59º em ciências. O que fazer para melhorar esses índices?
Wanda Engel – Os índices mostram que apenas aumentando os recursos destinados à Educação não se resolve o problema. Precisamos pensar com afinco na gestão desses recursos. Não adianta destinar 10% do PIB se não usarmos o conjunto de possibilidades dessa verba para melhorar os resultados. Precisamos investir em instalações eficientes e em formação de professores, por exemplo.
Os professores, atualmente, saem ideologizados das universidades, com informação sobre Montessori, Gilberto Freire, mas sem o saber necessário para exercer sua função. Sem saber matemática o suficiente, por exemplo. A verdade é que a gente não ensina a ensinar.