Não foi à toa que, de repente, o Brasil inteiro clamava pela derrubada da PEC 37 que tiraria poderes do Ministério Público, um órgão que, nos últimos anos, virou símbolo da luta contra os malfeitos em todo o país. Instalado em todos os municípios e, em geral, totalmente independente nas fiscalizações que faz, o MP passou a ser visto pela população como o foco de resistência aos desvios de verbas nos órgãos públicos.
Quase ninguém sabia o que era a PEC 37 mas todos compreenderam rapidamente que ela mexeria com o MP o que, na cabeça da maioria, era inadmissível.
Mas como no Brasil o poder central faz coisas de que até Deus duvida, sabe-se agora que nem tudo neste país está sendo fiscalizado pelo MP, quer federal quer estadual, e que o dinheiro público, até prova em contrário, está escoando pelo ralo onde menos se poderia esperar: nas remessas que o Governo Lula e, agora, o Governo Dilma, têm feito para países mais pobres a título de ajuda para construção de grandes obras de infraestrutura.
Foi o que acabou revelado durante a grande polêmica da semana quando a presidente, que já tinha remetido US$ 684 milhões, via BNDES, para a construção do Porto de Muriel, em Cuba, e foi a Havana inaugurar a obra, anunciou o envio de mais US$ 380 milhões para a mesma obra.
A viagem internacional de Dilma, que já tinha provocado perplexidade em Davos, onde ela mostrou um Brasil para inglês ver, totalmente dissociado da crise econômica, e a polêmica sobre os gastos presidenciais em Portugal, reverberou fortemente sobre Cuba quando a imprensa brasileira começou a investigar melhor o que está por trás do Porto de Muriel.
Descobriu-se então que Dilma anunciou a remessa de mais recursos para a obra sem que existisse um projeto sequer sobre a questão e que, desde o Governo Lula, o BNDES tem feito remessas para financiar projetos de infraestrutura “em países amigos” sem licitação, sem controle e sem fiscalização.
Os recursos são aprovados e liberados diretamente para empresas brasileiras escolhidas para executar os serviços. Ao contrário de qualquer serviço público prestado hoje no país por municípios, estados e até pela União que tem, obrigatoriamente, que ser licitado, com publicação no Diário Oficial, exame dos tribunais de contas e demais órgãos de controle, o BNDES aprova a remessa de recursos para obras no Exterior sem prestar contas a ninguém.
Em 2012, por exemplo, foram liberados pelo Banco US$ 2,17 bilhões para obras semelhantes às do Porto Muriel, em Cuba, e em 2013 foram liberados até setembro US$ 1,37 bilhões. Tudo isso sem que ninguém, a não ser a burocracia do Banco, tenha conhecimento de como está se dando a aprovação dos projetos e a fiscalização da execução dessas obras.
O fato, revelado pelo bem informado jornalista Cláudio Humberto não foi desmentido pelo Governo Federal. Nem mesmo a informação mais preocupante de todas. A de que, desde que Lula se tornou presidente, o Banco vem mantendo contratos semelhantes sob sigilo. Em relação ao Porto de Muriel, por exemplo, somente em 2027 o contrato de sua construção será disponibilizado publicamente.
O que dirá o povo brasileiro com mais esta demonstração de descontrole nos gastos públicos? Será que esses recursos não estão faltando por aqui para fazer ou concluir uma obra importante? Tudo bem, que se ajude a um país mais pobre mas, em pleno século 21, fazê-lo sob sigilo e sem fiscalização é algo com o que não deverão concordar os mais simples dos mortais.
Terezinha Nunes é deputada estadual pelo PSDB de Pernambuco